Franco Adailton
PRF
Traficantes internacionais de drogas têm utilizado Salvador como rota de escoamento de narcóticos para outros países. De janeiro a outubro de 2017, mais de duas toneladas de entorpecentes foram apreendidas no meio de cargas no porto, assim como entre bagagens de passageiros no aeroporto da capital baiana.
Os traficantes têm utilizado a técnica chamada rip-on / rip-off loading, termo utilizado pelas autoridades para descrever ato de inserir droga no meio das cargas regulares, em algum momento da viagem, sem conhecimento do dono.
Somente no Porto de Salvador, no Comércio, foram apreendidas 2,04 toneladas de cocaína entre as cargas, como resultado de operações conjuntas da Receita com a Polícia Federal (PF). Das cinco apreensões, quatro navios tinham como destino na Europa o porto de Antuérpia, na Bélgica.
A maior apreensão de 2017 ocorreu em março, quando a alfândega encontrou 562 quilos de cocaína em 20 bolsas em meio a um carregamento de pedras. A droga foi avaliada em cerca de R$ 39,3 milhões de dólares, o equivalente a R$ 121,4 milhões, à época.
A carga estava em um navio rumo à Bélgica, mas que, antes, já havia passado pelos portos de Santos (São Paulo), Paranaguá (Paraná), Navegantes (Santa Catarina) e Rio de Janeiro até chegar a Salvador, de onde seria despachada para a Europa.
Com o mesmo roteiro, outro volume que chamou atenção foi a apreensão no porto, no mês passado, de 540 quilos de cocaína escondidos em uma carga de madeira. A droga, que foi avaliada em aproximados R$ 60,6 milhões, chegou ao Brasil pelo porto de Rio Grande (RS).
Em agosto do ano passado, 441 quilos de cocaína avaliados em R$ 48,7 milhões chegaram do mesmo roteiro de portos no Brasil para serem levados à Bélgica. A única exceção à Europa foram os 220 quilos de cocaína encontrados num carregamento de cerâmica rumo a Manaus, em julho último.
Mudança de foco
Chefe da Divisão de Repressão ao Contrabando e Descaminho da Receita, o auditor-fiscal Joselito Correia suspeita que Salvador sempre tenha figurado como rota do tráfico internacional, que ficou mais evidente nos últimos dois anos com as operações voltadas a detectar drogas.
“Talvez, Salvador sempre tenha sido rota. A diferença é que, desde 2016, priorizamos o combate ao tráfico. Por isso, se tornou mais evidente. Como o serviço não estava voltado para esse fim, as drogas devem ter passado em outras ocasiões”.
Segundo Correia, as apreensões decorreram do emprego de uma série de fatores, a exemplo de técnicas de gerenciamento de risco, inspeção não invasiva (balança, scanner, raio-x, cão farejador), cooperação institucional com órgãos de segurança e troca de informações internacionais.
“É um jogo de gato e rato. Eles (os traficantes) colocam as drogas em algum momento da viagem, em algum porto. Sempre buscam inserir os tabletes em cargas densas, como madeira e pedra, por exemplo, para confundir os equipamentos de detecção”, afirmou.
Uma das técnicas usadas pela alfândega consiste em observar se o lacre original do contêiner é o mesmo utilizado desde a origem da carga. “Se o lacre não estiver intacto, abrimos a carga, acionamos os cães, além de empregar a tecnologia disponível”, detalha.
CERCA DE 100 KG DE DROGAS FORAM RETIDAS NO AEROPORTO
No Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães, foram apreendidos cerca de 100 quilos de drogas, de janeiro a outubro de 2017, de acordo com informações do chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da PF, delegado André Rocha.
Segundo ele, o volume apreendido no aeroporto se refere a drogas como cocaína, ecstasy e a variações mais fortes da maconha: haxixe, skunk e kush. Os narcóticos geralmente são transportados nas bagagens despachadas.
De acordo com informações fornecidas pela Receita, a mais recente apreensão ocorreu semana passada, com um homem que vinha de Barcelona em um voo da companhia aérea Air Europa, com procedência de Madrid, ambas na Espanha.
Natural de Mato Grosso, o passageiro trazia consigo sete quilos de haxixe escondidos em um parapente – equipamento semelhante a um paraquedas. O homem, de 30 anos, foi flagrado após a bagagem passar pelo aparelho de raio-x, já na capital baiana.
Em setembro do ano passado, três quilos de cocaína foram apreendidas com um passageiro guatemalteca de 31 anos, que vinha da Colômbia. O homem, que desembarcou em Salvador para fazer conexão, pretendia seguir viagem para aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro.
Operação
Para o delegado, as novas linhas de voo diretos da capital baiana para a Europa, “sem dúvidas”, têm sido um chamariz para o transporte dos narcóticos. “Essa abertura pode ser um fator que tem contribuído para as tentativas de distribuição das drogas”, avalia.
Segundo o delegado, em muitos casos, os traficantes que querem levar drogas daqui para o exterior acabam passando por Portugal, de onde parte para outros países da Europa. “Assim como Salvador, Portugal também pode ser considerada uma rota de passagem, de escoamento”, frisa.
Rocha salientou que, em uma das apreensões do ano, chamou a atenção o fato de um passageiro trazer, de Portugal, ecstasy líquido dentro de garrafas de vinho, em voo procedente da Holanda. “O que mostra que, devido à repressão, o tráfico busca mudar o modus operandi”, observa.
O delegado ressalta, ainda, que, além de utilizar os terminais convencionais, traficantes internacionais têm utilizado águas brasileiras para transportar drogas por meio de veleiros. “Geralmente, com destino à Itália, França e Espanha”, destacou.
Investigações
O auditor-fiscal da Receita frisa que, embora as apreensões nas cargas do porto não resultem em prisões em flagrante, o órgão encaminha relatório para subsidiar investigações da PF. “As ações têm gerado prejuízo enorme aos traficantes. Estamos falando de milhares de dólares”, acentua.
Segundo o delegado, a cada apreensão tem sido instaurado um inquérito para que a investigação ocorra de forma coordenada, inclusive, com articulações internacionais.
“Muitas vezes, a droga que passa por aqui é apreendida em fiscalização de rotina, mas já pode chegar sob suspeita”, informa.
Rocha cita como exemplo a Operação Brabo, deflagrada em setembro passado, que resultou nas prisões de 80 pessoas em vários estados. “A apreensão que ocorreu aqui foi resultado da coordenação de São Paulo, que já estava articulada com a Interpol na França e na Bégica”, pontuou.