Pesquisadores da USP investigam como a eliminação do microRNA-22 diminui o ganho de tecido adiposo e previne a dislipidemia.
Essa é mais uma coluna que me dá enorme prazer em escrever, porque trata da ciência de ponta produzida no Brasil. Ainda por cima, o tema é obesidade, epidemia que vem se alastrando pelo país, por isso o fato de nossos cientistas estarem debruçados sobre a questão é um alento para todos. A doutora Gabriela Placoná Diniz é professora assistente do Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP e coordena uma equipe de seis pesquisadores que têm investigado a ação de uma molécula chamada microRNA-22 e como a sua eliminação diminui o ganho de tecido adiposo e previne a dislipidemia. “É uma molécula regulatória chave, que pode ter um papel relevante no combate à obesidade e às disfunções metabólicas que ela provoca”, explica a PhD.
A doutora Gabriela Placoná Diniz, professora assistente do Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP — Foto: Acervo pessoal
Aqui tenho que fazer uma breve paradinha para lembrar alguns conceitos de biologia que ficaram esquecidos no Ensino Médio. RNA é uma molécula que carrega a informação genética do DNA, sendo essencial para a síntese de proteínas que compõem o organismo. Já o microRNA-22 é uma pequena molécula diferente do RNA comum, porque não produz proteínas. Seu papel é de regular a expressão de genes, de influenciar seu comportamento – como se fosse um botão de liga/desliga.
O grupo chefiado pela doutora Gabriela Diniz já produziu diversos estudos sobre o microRNA-22 e o último está sendo publicado na nova edição da “Metabolism”, importante revista da área. Os cientistas alimentaram dois grupos de cobaias com uma dieta hipercalórica por 12 semanas. Um grupo era composto por animais geneticamente modificados, que não tinham o microRNA-22 em nenhum tecido do corpo; o outro era de camundongos comuns. No grupo onde o microRNA-22 havia sido eliminado, o ganho de gordura foi significativamente menor e não houve aumento de colesterol e triglicérides.
Atrás, da esquerda para a direita: Tábatha de Oliveira Silva, Guilherme Lunardon, Caroline Antunes Lino, Vanessa Morais Lima, Juliane Braga Miranda. Na frente, também da esquerda para a direita: Camila Stephanie Balbino e Gabriela Placoná Diniz — Foto: Acervo pessoal
Mais um lembrete para entender a pesquisa: todos temos o tecido adiposo branco e o tecido adiposo marrom. O branco armazena gordura, o que é prejudicial à saúde, liberando moléculas inflamatórias que estão associadas a doenças cardiovasculares. O marrom é rico em mitocôndrias e, em vez de acumular, queima gorduras, melhorando as funções metabólicas. A beleza do experimento está aí: nas cobaias onde houve remoção do microRNA-22, mesmo com a dieta hipercalórica, havia diminuição da formação de tecido branco, com dois efeitos colaterais dos mais positivos. O primeiro: o tecido branco era estimulado e sofria uma transformação, tornando-se mais escuro (bege, com comportamento semelhante ao do marrom). O segundo: o tecido marrom tinha sua atividade aumentada, queimando calorias.
“O estudo mostra um dos mecanismos envolvidos na obesidade e representa um avanço para o desenvolvimento de novas estratégias para combatê-la”, afirma a cientista. O formidável dessa pesquisa é que pode levar, futuramente, à criação de um inibidor farmacológico, isto é, um medicamento. Biomédica com passagem pela iniciativa privada, a doutora Diniz diz que a paixão pela ciência a levou de volta à academia: “a obesidade é uma doença que gera uma série de complicações no organismo, impacta negativamente a qualidade de vida e com frequência leva ao óbito. Na USP, quero dar minha contribuição à sociedade”. G1