Brasil foi o maior investidor no vizinho nos últimos três anos; sistema tributário mais simples e custos menores aceleram crescimento do país, que recebe elogios até do FMI.
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A soma de benefícios fiscais, baixos custos de energia e de mão de obra e estabilidade das regras para investimento, entre outros fatores, tem feito o Paraguai se transformar em “rota de fuga” para empresas brasileiras que querem ampliar seus investimentos. Camargo Correa, JBS, Riachuelo, Vale, Bourbon, Eurofarma e Buddemeyer estão entre as companhias que encontraram no país vizinho uma opção de crescimento.
A lista inclui empresas que, seja por causa da alta carga tributária, da burocracia, da letargia atual da economia brasileira ou por outros motivos, não conseguem investir no Brasil. De acordo com dados do Banco Central do Paraguai, os investimentos brasileiros no país somaram 403 milhões de dólares no triênio 2012-2014. Isso fez do Brasil o país com maior volume de investimento em terras paraguaias nesse período. Se considerados os investimentos em estoque, que incluem aportes feitos no passado, o Brasil aparece em segundo lugar, com 856 milhões de dólares no fim de 2014, atrás apenas dos Estados Unidos.
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Entre os grandes empreendimentos que devem ser inaugurados nos próximos meses está um frigorífico da JBS, em construção no distrito de Concepción, no centro do país. O projeto, que conta com 800 trabalhadores na obra, teve investimentos de cerca de 60 milhões de dólares, com previsão de empregar 1 500 trabalhadores no início de suas atividades, no ano que vem. A lista inclui também a possível duplicação da capacidade de uma fábrica da Intercement, que tem como acionista a construtora brasileira Camargo Correa. O projeto teve investimentos de cerca de 150 milhões de dólares – o maior do Brasil feito no Paraguai – e ajudou a Intercement a deter 40% do mercado de cimentos do país vizinho.
No mês passado, a Riachuelo inaugurou uma fábrica de roupas em parceria com o empresário paraguaio Andres Gwinn, em um projeto que demandou investimentos de 5 milhões de dólares. Sob um acordo de exclusividade, a empresa brasileira forneceu maquinário e matéria-prima à unidade, que fica próxima ao aeroporto de Assunção. A fábrica emprega 300 funcionários atualmente, com previsão de ampliação para 1 200 até 2017. “A legislação paraguaia é muito amigável para a importação de matéria-prima, o que torna o nosso negócio competitivo”, diz Flávio Rocha, presidente da companhia. “O Paraguai possui custos atraentes perto dos da China, e o tempo de reprodução é rápido.” A fábrica tem capacidade para produzir 1 milhão de peças por ano.
A “diplomacia empresarial” só tem feito crescer nos últimos anos. Executivos brasileiros visitam o país em expedições realizadas quase todo o mês. A última, ocorrida no início de setembro, reuniu mais de 90 empresários e contou com a presença do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro. No econtro, discutiu-se a possibilidade de construir um polo automotivo em Ciudad del Este.
Quem faz essa espécie de ponte entre os empresários daqui e os de lá é o adido comercial do Paraguai no Brasil, Sebastian Bogado, funcionário da agência de Exportações e Investimentos do Paraguai (Rediex). Residindo no Brasil há cinco anos, ele conta que tem trabalhado “como nunca” nos últimos dois anos. “Não param de me contatar”, afirma.
O trabalho de Bogado consiste em percorrer o Brasil para apresentar o Paraguai como um “trampolim para internacionalização”, “plataforma de exportação” e de “consolidação” para as empresas. As reuniões são intermediadas por sindicatos, federações do comércio e indústria dos estados e associações setoriais, como de metalurgia, plástico, têxtil e brinquedos. “Eu dou exemplos de sucesso de empresas brasileiras e apresento as vantagens do país e as condições que oferecemos para os investimentos. Queremos mostrar que o Paraguai é uma opção viável, um país super sério”, diz.
Wagner Weber, presidente da Braspar, consultoria que há 21 anos faz interlocução entre empresas brasileiras que querem ir para o Paraguai, diz que nunca trabalhou tanto como agora. “No ano passado, de dez empresas que nos procuravam, três fechavam negócio. Atualmente, de dez, oito fecham”, afirma. “O Paraguai, com custos menores, é um país estruturado para o trabalho, que faz com que as empresas cresçam com rapidez.”
Muitas vezes tido pelos brasileiros como sinônimo de economia informal, o Paraguai é, hoje, um bolsão de crescimento em uma região que cresce pouco. A economia paraguaia vançou 14,3% em 2013 e 4,38% em 2014 – e, segundo o FMI, deve avançar 4% tanto neste ano como em 2016. Além disso, a inflação no país está controlada, na casa dos 4%, e o desemprego segue trajetória de queda. O PIB brasileiro, em contrapartida, praticamente inerte em 2014, deve recuar 3% em 2015 e 1% em 2016. Inflação (que deve passar de 9% em 2015) e desemprego (que já passou de 7% neste ano) seguem rota ascendente.
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Uma das provas de que o Paraguai já é visto com outros olhos pelo mundo ocorreu há duas semanas. Em apresentação do último relatório do FMI, em Lima, no Peru, o dirigente do fundo Alejandro Werner desfiou elogios às políticas monetária e fiscal do país. Na ocasião, ainda indicou que o Paraguai só não crescerá mais neste ano por causa da situação complicada em que se encontram os vizinhos Brasil e Venezuela.
Presidente-empresário – O empenho do Paraguai em se promover fora de seu território faz parte da estratégia do governo do presidente Horacio Cartes, eleito em 2013. Um dos homens mais ricos do país e dono de mais de uma dezena de empresas, Cartes não esconde seu plano de transformar o Paraguai num “país-empresa”, com uma gestão centrada em menos burocracia e mais eficiência.
“O presidente Horacio Cartes é um grande empresário paraguaio. Ele assumiu o governo com a visão de atrair investimentos estrangeiros”, disse ao site de VEJA o embaixador do Brasil no Paraguai, José Eduardo Felicio. “Foram propostas por esse governo novas leis de proteção de investimentos e de parcerias público-privadas. Tem havido o cuidado de melhorar o ambiente de negócios e a segurança jurídica.”
O presidente da Câmara de Comércio Brasil-Paraguai, Mauro Blumenthal Silka, citou que logo no começo da gestão de Cartes foram sancionadas duas leis que facilitaram os negócios: a lei de responsabilidade fiscal – que fixa o limite de déficit fiscal em 1,5% do PIB – e a lei de Parcerias Público-Privadas (PPP), voltada a obras de infraestrutura. “Essas duas leis colaboraram para que a agência Moody’s melhorasse a avaliação do Paraguai de Ba3 a Ba2 em janeiro de 2014, alterando a perspectiva de ‘estável’ para ‘positiva'”, diz Silka. Em janeiro deste ano, outra agência de risco, a Fitch, elevou a qualificação da dívida soberana do Paraguai de BB- a BB, com perspectiva estável.
No início de outubro, o governo paraguaio deu mais detalhes sobre um megaprojeto de infraestrutura no valor de 1,1 bilhão de dólares. Entre as obras anunciadas está uma segunda ponte de ligação entre o Brasil e o Paraguai, a “ponte da Solidariedade”. A obra foi avaliada em 212 milhões de dólares. Por ora, a única ponte que liga os dois países é da Amizade, conhecida rota de passagem dos chamados sacoleiros.
Um dos mais expressivos fatores de atração do país é a Lei da Maquila. Regulamentada em 2000 e inspirada no modelo mexicano, o regime permite que as empresas estrangeiras importem maquinários e insumos, desde que o produto final seja vendido para fora do Paraguai, por uma alíquota única de 1%. Atualmente, existem cerca de 100 maquiladoras no país, sendo que a metade delas é de capital brasileiro, diz o adido Sebastian Bogado.
Além dessa lei, o Paraguai oferece às empresas uma vantagem que o Brasil não dispõe mais desde o ano passado. O país integra o Sistema Geral de Preferência europeu, que concede benefícios fiscais para produtos exportados por nações de renda baixa. O Brasil foi excluído do programa por não ser considerado mais pobre. Assim, quem exporta do Paraguai tem acesso ao mercado europeu com tarifa zero. “É uma ferramenta que coloca o seu produto no mundo”, diz Sarah Nogueira, gerente de serviços de Internacionalização da Companhia Nacional da Indústria (CNI), Sarah Saldanha.
O diretor financeiro da Buddemeyer, tradicional fabricantes de toalhas, Evandro Miller de Castro, tem na ponta da língua a longa lista de vantagens oferecidas pelo Paraguai. “Lá a legislação fiscal é de uma simplicidade fiscal sem tamanho. A lei trabalhista é muito melhor. A inflação deles é de 2% ao ano. Há dez anos que não há aumento de tarifa na energia elétrica. Pela lei da Maquila, você ainda importa matéria-prima sem imposto”, diz. O executivo também não segura a língua na hora de se queixar do ambiente de negócios no Brasil. “A maçaroca fiscal daqui é um horror, intolerável, é um ambiente antinegócios. Ainda tem o inferno astral que você passa para fechar o balanço fiscal da empresa”.
A Buddemeyer tem uma fornecedora no Paraguai há pelos menos dez anos. Em 2015, a companhia, fundada em 1952 em São Bento do Sul (SC), resolveu se fundir com a parceira estrangeira. Juntas, elas ergueram uma fábrica no país. Castro não revela detalhes sobre a fusão, como o endereço da nova instalação e o valor do negócio, mas confirma que a empresa pretende ampliar os seus negócios no Paraguai. “Se eu contar, amanhã vai ter um monte de concorrente do meu lado”.
O salário mínimo no Paraguai é de 1,8 milhão de guaranis (quase 1 200 reais), e os encargos sociais são bem menores que os brasileiros. O empregador não precisa desembolsar o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e as férias renumeradas são de 12 dias para os primeiros cinco anos trabalhados. Tirando o Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica, no Paraguai, cobra-se dos empresários apenas o Imposto sobre Valor Agregado, o IVA, que se equipara a três impostos (PIS, Cofins e ICMS) cobrados no Brasil.
Mas nem tudo são mil maravilhas. O que ainda deixa as empresas com um pé atrás é o bitributarismo – as companhias que atuam tanto aqui como lá precisam pagar imposto nos dois países. Por isso, a questão já faz parte da agenda a ser tratada entre as duas nações. O dólar valorizado em relação ao real também leva as empresas brasileiras a se afastar de despesas em moeda estrangeira. “Mas o guarani também tem caído. E daí surge a necessidade de as companhias pensarem em exportar mais, pois elas vão começar a ganhar em dólar”, afirma Sarah Saldanha, da CNI. “Mesmo com o dólar a quatro reais, se você faz as contas, ainda compensa”, reforça Castro, da Buddemeyer.
Segundo pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) publicada em julho deste ano, o Paraguai desponta com a maior pontuação entre os países da América do Sul no indicador de clima econômico (ICE) dos últimos quatro trimestres, com 120 pontos. No mesmo ranking, o Brasil está na penúltima colocação, à frente da Venezuela, com 55 pontos.REVISTA VEJA.
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