Pela primeira vez desde o início da guerra, Zelenski anunciou a demissão de dois funcionários do serviço de segurança nacional, sob suspeita de traição.
“Temos que corrigir esses erros horríveis, e corrigi-los agora”, disse o ucraniano em um discurso ao Parlamento da Austrália.
Para Zelenski, a resposta que a comunidade internacional dá agora à ofensiva de Moscou -que ele considera branda e insuficiente- pode ser determinante em possíveis conflitos futuros.
“Se não paramos a Rússia agora, se não responsabilizarmos a Rússia, alguns outros países do mundo que estão ansiosos por uma guerra semelhante contra seus vizinhos decidirão que essas coisas também são possíveis para eles”, afirmou. “O destino da segurança global está decidido agora.”
Embora não tenha mencionado nenhum país especificamente, a declaração pode ser interpretada como um alerta sobre a posição da China em relação a Taiwan.
A tese ganha força a partir de dois fatores: o fato de que Zelenski aposta no uso de referências históricas do passado e do presente dos países que o recebem e a postura recente dos seus interlocutores na ocasião. A Austrália tem vivido uma série de embates em várias frentes contra Pequim e vem expressando preocupações sobre a linguagem cada vez mais agressiva usada pelo regime de Xi Jinping contra a ilha que a China considera uma província rebelde.
Cinco semanas depois da invasão que destruiu cidades inteiras e criou um fluxo de refugiados que já ultrapassa a marca de 4 milhões, Zelenski disse em pronunciamento que a Ucrânia está se preparando para receber novos ataques na região leste, onde as forças de Moscou agora estariam concentradas depois verem freada sua ofensiva contra Kiev.
O presidente, por óbvio, tenta ressaltar o papel da resistência das tropas sob seu comando, mas sabe que a realidade é menos romantizada.
Pela primeira vez desde o início da guerra, Zelenski anunciou a demissão de dois funcionários do serviço de segurança nacional, sob suspeita de traição.
“Não tenho tempo para lidar com todos os traidores, mas eles serão gradualmente punidos”, disse o presidente, que não deu detalhes do que ocorreu.
A missão do Kremlin na Ucrânia agora se concentra em “libertar” a região do Donbass, no leste do país. Lá estão as províncias de Lugansk e Donetsk, cujos líderes separatistas recebem apoio russo desde 2014 e tiveram sua independência reconhecida por Moscou três dias antes do início da guerra.
Alvo da Rússia há semanas justamente por sua posição estratégica entre o Donbass e a Crimeia, Mariupol segue sob cerco.
“Teremos batalhas pela frente. Ainda precisaremos passar por um caminho muito difícil para conseguirmos o que queremos”, disse Zelenski sobre a situação na região.
Moscou chegou a anunciar que realizaria, nesta quinta, um cessar-fogo no local para a instauração de corredores humanitários. Mas, já na quinta, a agência russa Tass disse que, na verdade, a medida deve ser aplicada na sexta-feira (1º).
Segundo a agência, os militares russos estariam atendendo a pedidos do presidente da França, Emmanuel Macron, e do chanceler alemão, Olaf Scholz.
Um comboio da Cruz Vermelha também se prepara para ajudar na retirada de civis da cidade, diante da expectativa de que a batalha se intensifique.
O secretário-geral da Otan (aliança militar ocidental) afirmou ainda que, segundo seus serviços de inteligência, já está claro que a Rússia não está recuando ao sair de Kiev, mas sim se reorganizando.
“Unidades russas não estão desistindo, mas se reposicionando. A Rússia tenta se reagrupar, se reabastecer e reforçar sua ofensiva na região de Donbass”, afirmou.
“Podemos esperar mais ataques, […] não houve mudança no objetivo real da Rússia”, completou.
Enquanto os reforços russos não chegam até Mariupol, nesta quinta um bombardeio russo atingiu uma unidade militar ucraniana e um depósito de combustíveis na região de Dnipro, que fica a pouco mais de 300 km para o interior do país.
Ainda nesta quinta, 134 mil reservistas foram recrutados pelo Exército russo, o que levantou o alerta sobre um possível reforço para a guerra. No entanto, o Ministério da Defesa afirmou que a medida não tem qualquer relação com a Ucrânia, reverberando o já dito por Putin anteriormente, de que apenas forças regulares lutariam no front.
Segundo comunicado emitido pelo governo turco após o telefonema entre os líderes, Erdogan reforçou a sugestão de que os dois presidentes se encontrassem em seu território e disse que, no país, as negociações deram um “impulso significativo” para por um ponto final na guerra, ainda que essa perspectiva ainda pareça distante do horizonte real.
Enquanto o futuro da guerra segue incerto, o Kremlin respondeu à alegação feita por autoridades ocidentais de que o presidente Vladimir Putin estaria sendo mal assessorado durante o conflito e que, por isso, não estaria consciente do real desempenho de suas tropas.
“Para nosso pesar -e, de fato, isso provavelmente nos causa preocupação- acontece que nem o Departamento de Estado nem o Pentágono têm informações reais sobre o que está acontecendo no Kremlin”, disse o porta-voz de Putin, Dmitri Peskov.
“Eles simplesmente não entendem o que acontece no Kremlin, não entendem o presidente Putin, não entendem o mecanismo de tomada de decisões e não entendem a maneira como trabalhamos”, afirmou, acrescentando que um mal-entendido como esse pode ter consequências ruins em um contexto de guerra.
Peskov se referia ao fato de que a inteligência dos EUA divulgou que Putin viria sendo enganado por seus generais sobre o péssimo desempenho de seus militares no país vizinho.
“Temos informações de que Putin se sentiu enganado pelos militares russos, o que resultou em tensão persistente entre Putin e sua liderança militar”, disse Kate Bedingfield, diretora de comunicações da Casa Branca, na quarta-feira (30).
Ainda no campo das acusações, o presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou nesta quinta que Putin estaria “se isolando” e teria demitido e colocado em prisão domiciliar alguns conselheiros. O líder norte-americano, no entanto, não citou nenhuma evidência para embasar suas alegações.
Enquanto isso, pelo menos na Rússia, as pesquisas apontam que a aprovação de Putin não para de crescer desde que a guerra começou, em 24 de fevereiro, alcançando o maior patamar em quatro anos.
De acordo com o instituto independente Levada, 83% da população o aprova como presidente -número semelhante ao divulgado anteriormente em pesquisas feitas por entidades pró-governo.