O auge recente da escassez de contêineres refrigerados, antes do bloqueio de Suez surgir no radar, ocorreu no fim do mês passado, segundo executivos da Hamburg Süd, transportadora marítima integrante do grupo dinamarquês A.P. Moller-Maersk. Esse desequilíbrio se insere no contexto mais amplo da desorganização dos fluxos de transporte, cujo maior reflexo é o encarecimento do frete para a China, fenômeno global verificado desde meados de 2020, que ainda não foi dissipado.
No início da pandemia, restrições ao comércio e ao transporte e a queda na demanda paralisaram navios mundo afora. No segundo semestre, a demanda por bens – já turbinada pelo fato de que, por causa do distanciamento social, famílias do mundo todo passaram a gastar mais em produtos do que com serviços – voltou mais rapidamente do que o esperado, levando a uma corrida pelos serviços de transportes. Houve falta de contêineres e navios, enquanto as operações seguiam, em alguma medida, mais lentas por causa dos protocolos contra a covid-19. A situação foi definida por empresários do setor de transporte marítimo como “tempestade perfeita”.
Como resultado, o preço médio do frete entre Brasil e China disparou. Por um lado, insumos para fabricar produtos como eletrodomésticos, eletrônicos e roupas ficam mais caros, pressionando essas indústrias a aumentarem os preços ao consumidor. No lado das exportações, os mais prejudicados são os produtores de carnes e frutas, porque os desequilíbrios na logística se concentram na movimentação de cargas em contêineres. Os principais itens exportados pelo Brasil – soja, milho e minério de ferro – são transportados em grandes navios graneleiros fretados por inteiro.
Segundo José Salgado, diretor executivo comercial da Hamburg Süd no Brasil, até o fim de fevereiro, a empresa deixou de entregar 5% do volume total de exportações refrigeradas com o qual se comprometeu em contratos. Para resolver o problema, a empresa está fazendo uma busca ativa por contêineres, evitando descartar contêineres antigos cuja vida útil pudesse ser ampliada com manutenção e alugando navios adicionais.
Carnes e frutas
No Brasil, os contêineres refrigerados são usados basicamente para exportações de carnes e frutas, disse Bruno Carneiro Farias, presidente da F Trade, agência especializada em logística para comércio exterior. Só que não dá para comparar os embarques de carnes com os de frutas. Maior produtor e exportador global de carne bovina, o Brasil mandou para o exterior 2 milhões de toneladas de carne vermelha ano passado, uma receita de US$ 8,5 bilhões, conforme a Abiec, associação dos exportadores de carnes. Já os produtores de frutas venderam para fora 1 milhão de toneladas – manga, melão, uva e limão são os destaques -, com receita de US$ 876 milhões, mostram dados da Abrafruta, entidade do setor. “Um cliente grande de limão exporta 600 contêineres por ano. Um cliente grande de carne exporta mil contêineres por semana”, afirmou Farias.
As frutas têm safra, com picos de produção. Em função disso, muitos pequenos produtores e cooperativas recorrem ao mercado “spot”. Diante dos desequilíbrios, a Hamburg Süd abriu mão, por exemplo, de fechar contrato para transportar as exportações de maçã de Santa Catarina, disse Mariana Lara, diretora de vendas. Também deixou de transportar exportações de ovos.
Para Alexandre Duarte, diretor de logística da Abrafrutas, a desorganização global dos transportes afetará as exportações brasileiras de frutas de forma inevitável. Isso porque o transporte aéreo, usado nas frutas frescas de alto padrão, também está em crise – boa parte das cargas era embarcada em voos de passageiros, travados desde o ano passado por causa da pandemia. A saída dos produtores será escoar as frutas tipo exportação para o mercado nacional – o Brasil exporta de 2% a 3% da produção total de frutas, em volume. A única boa notícia é que, para os consumidores, poderá haver algum alívio nos preços.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.