Sem Padilha, a solidão política de Temer chega ao nível da calamidade
(*) Paulo Moreira Leite
A providencial cirurgia na próstata anunciada por Eliseu Padilha, 24 horas depois de ter sido denunciado pelo amigo presidencial José Yunes como destinatário de uma mala de dinheiro, confirma que o fim de Michel Temer está próximo.
Por mais que seja possível insistir na coreografia –e Brasília já viu muitos espetáculos semelhantes — o governo acabou esta manhã.
A versão de que Padilha afasta-se do governo por razões médicas não merece credibilidade. A história inteira é outra.
Antes do depoimento de José Yunes vir a público, o chefe da Casa Civil seguia em sua vida normal de ministro e grande manda-chuva do Palácio. Por exemplo. Até agora, o ministro possuía uma agenda normal às suas atividades.
Tinha compromissos marcados até para a quarta-feira de cinzas, cinco dias depois da entrevista do amigo do Temer que o acusou. Um deles envolvia uma audiência com empresários e sindicalistas envolvidos no debate sobre conteúdo local nos investimentos do pré-sal. Agora, está cuidando da próstata.
Sem Padilha, a solidão política de Temer chega ao nível da calamidade.
No final de novembro, no escândalo envolvendo uma cobertura milionária em Salvador, o outro amigo, Geddel Vieira Lima, já havia deixado a Secretaria de Governo.
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Juntos há muitos anos, até há pouco eles formavam um trio azeitado, os verdadeiros chefes do grupo político que assumiu o Planalto após o golpe que derrubou Dilma.
Eram os protagonistas no centro das grandes decisões, aqueles com a palavra final nos assuntos graves e fundamentais — inclusive nomear e demitir.
Funcionavam assim desde o governo Fernando Henrique Cardoso, que deixou o Planalto em janeiro 2003, isto é, quatorze anos atrás. Em suas memórias FHC emprega a expressão “cheirando mal” para se referir a movimentos de Padilha — sempre em companhia de Temer e Geddel — para emplacar um ministério, que, afinal, acabou conseguindo.
Olhando para o futuro próximo, basta recordar que as delações da Odebrecht ainda não saíram do forno. Ainda podemos aguardar pela Camargo Correa, OAS, para imaginar o que aguarda a última ponta do triângulo.
Por enquanto, basta lembrar que o próprio Yunes acertou o peito de Temer ao revelar — empregando uma estranha linguagem de traficantes de drogas — que tinha informado ao presidente que havia atuado como “mula” a serviço do chefe da Casa Civil.
Neste ambiente, a saída de Temer caminha para se tornar uma necessidade prática antes de se tornar um clamor nacional. Pode ser fruto de um ato de renúncia, voluntário e unilateral, possível a qualquer momento.
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Outra hipótese é o julgamento pelo TSE. No inferno em que se transformou o governo, a cassação do mandato de Michel Temer será um favor.
Neste momento, o debate sobre a sucessão antecipada de Temer ganha corpo e velocidade.
Há uma operação vergonhosa em andamento. Depois de desrespeitar a Constituição quando isso era conveniente a seus interesses, as forças que articularam a derrubada de Dilma tentarão esconder-se atrás da Carta de 1988 para operar um pleito indireto, num Congresso que o suíço Eduardo Cunha montou.
Com isso, manterão o povo, mais uma vez, longe do direito de opinar sobre os destinos do país. Também será possível tentar algum lance de mágica para mudar o cenário atual para 2018, assim descrito na Folha de S. Paulo, edição de hoje, pelo insuspeito Reinaldo Azevedo: “as nuvens que se armam ameaçam jogar o país, mais uma vez, no colo das esquerdas. Tudo o mais constante (…), é ao encontro delas que marchamos.”
Não é uma boa ideia. Só ajuda a criar tumultos desnecessários e incertezas. A solução — urgente — consiste em retomar o debate sobre a emenda que o obriga a realização de diretas-já, unica forma para o país recuperar a democracia.
(*) Jornalista do Diário do Centro do Mundo
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