Márcio, de 40 anos, e Ailton, de 62, são dois exemplos de pessoas que não resistiram à Covid-19 antes mesmo de conseguirem uma vaga para serem internados no estado.
Por Erick Rianelli, Anita Prado e Gabriela de Palhano, RJ1
Desde o início deste ano, 300 pacientes morreram nas emergências e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) à espera de um leito de internação no estado do Rio de Janeiro.
Márcio, de 40 anos, precisava de um leito de UTI para Covid mas, segundo a família, estava sem assistência adequada na UPA estadual de Ricardo de Albuquerque, Zona Norte do Rio.
“A UPA só deixou ele de lado. Colocou um oxigênio no nariz dele e não deu mais nenhuma assistência. Ele ficou sexta-feira e sábado. No sábado, ele viu duas pessoas morrerem ao lado dele. Mandou mensagem para a gente implorando que tirassem ele da UPA porque lá ele iria morrer. Tentamos fazer a transferência para vários hospitais, mas todos estavam lotados”, disse o filho de Márcio.
A capacidade de respiração de Márcio foi diminuindo, até que ele ficou sem ar. “Na madrugada de sábado, infelizmente ele veio a óbito, sendo mais um caso de morte por Covid por falta de atendimento na rede pública. Tenho certeza que se tivesse sido transferido, ele teria tido uma chance de lutar pela vida”.
Aílton e Márcio não conseguiram ser internados. — Foto: Reprodução/TV Globo
Para muitos doentes, a espera foi longa demais. De janeiro até esta terça-feira (6), 59 pessoas morreram de Covid nas UPAs municipais e mais 93 nas estaduais.
Pacientes também morreram nas coordenações de emergência à espera de leitos. Foram 149 pessoas em seis unidades desde janeiro.
Nesta terça, na capital, 235 pacientes estão na fila por uma vaga em hospitais.
A rede SUS do Rio trata 1.679 com sintomas da Covid. A taxa de ocupação dos leitos de UTI chega a 94% – são 780 pessoas em estado grave. Nas enfermarias, a lotação também é preocupante: 90%.
- PELO BRASIL: No estado de SP, quase 500 pessoas com Covid-19 morreram à espera de um leito de UTI em março
Determinações judiciais aumentaram
As ordens judiciais para transferências de pacientes dispararam. Foram 58 em janeiro, 63 em fevereiro e 144 em março – um aumento de 148,2%, segundo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Uma das promessas do Governo do Estado para aliviar a situação em toda a Região Metropolitana era a abertura do Hospital Modular de Nova Iguaçu.
Era a esperança de Ailton Alencar, de 62 anos. Ele morreu na UPA de Edson Passos, em Mesquita. A vaga não foi aberta a tempo.
“Ele teve um mal súbito – a saturação foi a 70 e a glicose aumentou muito, ficou acima de 250. O médico da tarde falou que talvez fizesse uma transferência para o hospital de campanha que seria inaugurado em Nova Iguaçu no sábado. O médico da noite comunicou que meu marido estava muito mal, que ele realmente precisava de um lugar com intubação. Meu marido acabou passando mal. Ele não resistiu e após as 23h, ele teve duas paradas cardiorrespiratórias”, relembrou a viúva Renata Pereira.
A Prefeitura do Rio informou que, em 2020, a média de mortes nas UPAs era de 129 pacientes por mês e que, em 2021, houve uma redução de 61%. O percentual de mortes fora de leitos hospitalares caiu 41%.
Até o momento da publicação deste texto, o Governo do Estado não havia respondido sobre a morte de Márcio.