A redução no volume cerebral pode afetar distintas capacidades humanas a depender da região que é comprometida.
A pesquisa, liderada por cientistas da Universidade da Pensilvânia e publicada na revista Nature Communications, analisou quase 37 mil imagens cerebrais do UK Biobank, um banco de dados de saúde da Inglaterra. Essas informações foram de adultos que tinham entre 40 e 69 anos de idade.
“O estudo tem um número grande de pessoas e isso nos ajuda a entender um fenômeno que não conseguiríamos com 100 ou 200 participantes, então ele ajuda a esclarecer que existe um mecanismo de agressão cerebral”, afirma Edson Amaro, neurorradiologista, pesquisador do Instituto do Cérebro e superintendente de ciência de dados e analytics do Einstein.
Os pesquisadores observaram o efeito que diferentes níveis de consumo do álcool – considerando ingestão diária de no mínimo 10 ml e até 40 ml – tinham no volume cerebral. Foi utilizado um mecanismo em que se analisou o efeito no volume das regiões branca e cinza.
“A substância branca é como se fosse o sistema de conexão cerebral por meio de fibras que ligam uma parte à outra e também conectam o cérebro ao resto do corpo”, diz Amaro.
Segundo ele, é na substância branca que se encontram os prolongamentos dos neurônios e também as células da glia, responsáveis pela sustentação das atividades cerebrais.
Já o núcleo dos neurônios se concentra na substância cinza. São nessas regiões que são processadas as informações vindas das conexões entre essas células que acontecem na região branca do órgão.
“O interessante é notar que foi pequena a magnitude desse efeito. Foi observada que em torno de 0,3% a 0,4% da variação total de uma região é explicada por álcool em relação a qualquer outra variável, como idade ou sexo. Idade, por exemplo, é um grande fator para redução do volume cerebral”, explica o neurorradiologista.
Além da alteração no volume, a pesquisa atentou-se a outro mecanismo que é o de difusão. Nesse caso, é observada a capacidade da conexão, que ocorre na substância branca, entre os neurônios, algo essencial para a atividade cerebral.
“Isso não tem nada a ver com o volume que diminui. Aqui seria sobre a organização da substância branca que teria essas alterações com o consumo da bebida”, diz.
Mesmo que esse seja um mecanismo diferente para observar os efeitos do álcool no cérebro, os resultados foram bastante semelhantes: um impacto negativo, mas com pequeno efeito prático.
O resultado baixo não quer dizer que não se deve ter cuidados com o consumo do álcool. Amaro diz que os impactos sentidos são muito maiores para aqueles que têm um consumo excessivo da substância já que ela é realmente considerada como neurotóxica.
A redução no volume cerebral pode afetar distintas capacidades humanas a depender da região que é comprometida. A fala, por exemplo, tem como área mais importante a parte frontal esquerda.
Neste estudo, não houve a observação direta dessas regiões que são afetadas já que a pesquisa se atentou ao volume total do órgão.
Mas o fato de a massa ter diminuído não indica que, necessariamente, haverá problemas já que o cérebro tem um mecanismo em que outros neurônios podem realizar a função daqueles debilitados –fenômeno conhecido como plasticidade cerebral.
“Quando a gente perde volume, como no caso do álcool, pode ser que a quantidade do volume reduzido leve a algum comprometimento e a pessoa tenha um sintoma, mas às vezes não têm, porque o cérebro ‘se conserta'”, explica Amaro.
Algo que poderia ser feito para explorar com mais detalhes a gravidade desses problemas ocorridos mediante a diminuição do volume cerebral em decorrência do álcool seria a realização de estudos controles. Nesses casos, será possível monitorar dois grupos diferentes a fim de constatar os efeitos que o álcool teria no grupo que utiliza a substância em contrapartida ao outro segmento que seria o controle.
Outro ponto que escapa da pesquisa é em relação a um segmento mais jovem da população já que os dados utilizados são considerados somente de adultos com mais de 40 anos. Além disso, os dados considerados são somente da população britânica, sendo importante alargar em outras pesquisas para outras comunidades.
“Fica a dúvida de se o estudo só funciona com aquela população porque ela tem uma herança genética diferente da nossa, condição socioeconômica distinta e as razões de consumo do álcool também podem ser outras. Ou seja, nós não temos muitas outras variáveis, então não sabemos se esse efeito do álcool com esta magnitude é particular nessa população”, conclui o neurorradiologista.