A discussão a seguir, apresenta um exercício prospectivo para o sistema de saúde de Mato Grosso do Sul. Tem como base fundamental um modelo matemático criado por um grupo de pesquisadores ligados à Universidade de São Paulo e Universidade do Porto (KAY, AMORIM & VECINA NETO,2020).
O presente texto tem teor jornalístico, sem a pretensão de um artigo científico portanto, escrito com menor rigor metodológico. Tem objetivo de propor uma discussão, ainda que superficial, importante para o momento em que nos debatemos entre a razão e a emoção que cercam as escolhas entre saúde econômica e perspectivas de mortes de cidadãos.
O modelo matemático usado segue algumas premissas básicas, por exemplo: apenas 5% da população contaminada necessitará de recursos de saúde; quem necessitar de tais recursos os ocupará por 10 dias; que ocorrerá um incremento de 10% no número de leitos graças as ações do Ministério da Saúde e que os leitos atuais serão majoritariamente ocupados por pacientes do Covid-19 ( entre 60 e 95%, incluído recursos públicos e privados).
Qualquer modelo matemático apresenta limitações e os cenários podem variar em relação ao percentual da população atingida pelo Covid-19, mas o modelo segue alguns parâmetros baseados no vem sendo observado em outros países. É necessário lembrar que estamos no inicio do inverno e Mato Grosso do Sul possui situações climáticas bastante díspares em suas diversas regiões, o que mudaria o cálculo de contaminação.
Também para todos os cenários foi adotado como premissa a suspensão de processos eletivos na rede pública e privada de saúde (o Governo Estadual já oficializou esta medida) portanto, considera-se para efeito de capacidade o saldo de leitos disponíveis para serem usados pelos demandantes de recursos portadores do Covid-19.
Cenário 1 – Otimista – 0,5 % da população infectada
Este é o cenário base (Figura 1), ou seja, considera as condições de propagação parecidos com a situação da China, em que muitas medidas foram tomadas para evitar a contaminação da população. Neste cenário o modelo matemático limita o número total de infectados em Mato Grosso do Sul de 13.895 infectados.
É possível observa o comportamento da curva diária de demandantes de recursos de saúde e a variação das perspectivas de velocidade de propagação que pode ser mais rápida ou mais lenta a depender das medidas de contenção que permita o contato da população em geral com as pessoas infectadas.
Figura 1 – Cenário com 0,5 % da população contaminada
Verifica-se que, mesmo em um cenário otimista haverá, em qualquer situação, um déficit entre a capacidade total e a demanda de oferta de leitos que pode variar entre 50 e 350 leitos, a depender da velocidade de propagação.
Com uma velocidade de propagação de 45% o déficit será maior (déficit durante o pico de contaminações de aproximadamente 350 leitos) e chegará mais rápido ( aproximadamente 20 dias), enquanto uma velocidade de propagação de 15% posterga o tempo de chegada (o colapso chegará em aproximadamente 57 dias) e diminui o déficit (aproximadamente 50 leitos durante o pico de contaminação).
Cenário 2 – Provável – 1 % da população infectada
Este é o cenário 2 (Figura 2), ou seja, considera as condições de propagação parecidos com a situação a da Itália e EUA, em que as variáveis climáticas e outros elementos culturais em relação à higiene e contatos sociais podem aumentar a parcela infectada da população. Neste caso o modelo projeto um total de 27.790 pessoas infectadas no Estado.
É possível observa o comportamento da curva diária de demandantes de recursos de saúde e a variação das perspectivas de velocidade de propagação que pode ser mais rápida ou mais lenta a depender das medidas de contenção que permita o contato da população em geral com as pessoas infectadas.
Figura 2 – Cenário com 1 % da população contaminada
Verifica-se que, neste cenário, haverá um déficit entre a capacidade total e a demanda de oferta de leitos que pode variar entre 300 e 950 leitos (aproximadamente), a depender da velocidade de propagação.
Com uma velocidade de propagação de 45% o déficit será maior (déficit durante o pico de contaminações de aproximadamente 950 leitos) e chegará mais rápido ( aproximadamente 20 dias), enquanto uma velocidade de propagação de 15% posterga o tempo de chegada (o colapso chegará em aproximadamente 57 dias) e diminui o déficit (aproximadamente 300 leitos durante o pico de contaminação).
Cenário 3 – Pessimista- 3 % da população infectada
Este é o cenário 3 (Figura 2), considera as condições de propagação improvável porém possível, pois nenhum pais ainda conhece o seu momento de pico de contaminação exceto, talvez a China na província onde foram registrados os primeiros casos, mas cujo sistema de contenção tem se mostrado bastante eficiente. Dificilmente o Brasil conseguiria implementar medidas de contenção semelhantes o que nos coloca em uma situação de perspectiva de contaminação que deverá superar os percentuais de outros países. Países que não adotaram medidas de contenção com Inglaterra e EUA estão revendo suas posições e adotando mais medidas sociais restritivas.
Neste cenário o comportamento da curva diária de demandantes de recursos de saúde e a variação evolui drasticamente para uma situação caótica em Mato Grosso do Sul. das perspectivas de velocidade de propagação que pode ser mais rápida ou mais lenta a depender das medidas de contenção que permita o contato da população em geral com as pessoas infectadas.
Figura 3 – Cenários com 3 % da população contaminada
Verifica-se que, neste cenário, haverá um déficit entre a capacidade total e a demanda de oferta de leitos que pode variar entre 2.500 e 5.600 leitos (aproximadamente), a depender da velocidade de propagação.
Com uma velocidade de propagação de 45% o déficit será maior (déficit durante o pico de contaminações de aproximadamente 5.600 leitos) e chegará mais rápido ( como nos demais cenários aproximadamente 20 dias, o que muda é o tempo em que o sistema permanecerá em colapso), enquanto uma velocidade de propagação de 15% posterga o tempo de chegada (o colapso chegará em aproximadamente 57 dias) e diminui o déficit (aproximadamente 2.500 leitos durante o pico de contaminação).
Conclusão
Depreende-se que, em qualquer cenário, Mato Grosso do Sul tende a apresentar o que o Ministro Mandetta chamou de colapso, ou seja, a demanda superará a oferta de leitos. Medidas como as que estão sendo tomadas e São Paulo e Rio de Janeiro deverão ser implementadas aqui, na forma de hospitais de campanha, com recursos próprios adicionais que permitam diminuir tal déficit sob pena de aumento do número de mortos.
Outra conclusão é que sem as medidas de contenção da velocidade de contaminação o quadro será exponencialmente mais dramático seja qual for o percentual de contaminação.
Apesar dos impactos negativos sobre o sistema econômico, a perspectiva de um número elevado de pessoas morrendo e a de se impor aos profissionais de saúde já sobrecarregados, a decisão sobre vida e morte das pessoas incluídas nos grupos de risco, pode ser maior que os aspectos emocionais e/ou racionais que cercam o falso dilema entre economia e vida humana.
*José Roberto da Silva Lunas
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS
Curso de Engenharia Ambiental/Turismo/Administração
Dourados