Economistas ouvidos pelo G1 afirmam que benefício recompôs a renda perdida durante a crise e incentivou o consumo.
Por Marta Cavallini e Raphael Martins, G1
01/09/2020 09h07 Atualizado há 3 horas
Com aumento do desemprego e queda de renda por conta da pandemia do novo coronavírus, o brasileiro foi obrigado a cortar gastos. A família de Hilderlania Alves, contudo, faz parte de um grupo que sentiu efeitos contrários: sua renda dobrou e permitiu a compra de roupas, calçados, produtos de limpeza e até adquirir pacote de dados de internet no celular.
Hilderlania Alves e sua mãe, Luciana Nunes, já receberam quatro parcelas do Auxílio — Foto: Arquivo pessoal
O fenômeno tem nome e sobrenome: Auxílio Emergencial. Foi ele o principal responsável por recompor a renda perdida de 60 milhões de pequenos empresários, liberais e profissionais informais, e por dar gás para o consumo, principal motor da economia brasileira.
Até agora, o programa tem aprovadas 5 parcelas de R$ 600 para cada beneficiário (mães chefes de família recebem parcelas de R$ 1,2 mil). Outras 4 parcelas de R$ 300 foram anunciadas nesta terça-feira (1º) pelo presidente Jair Bolsonaro, e devem ser oficializadas por Medida Provisória.
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Para economistas ouvidos pelo G1, ainda que o benefício não tenha sido suficiente para reverter a queda de 9,7% do PIB neste segundo trimestre de 2020, o tombo seria bem maior se não houvesse a transferência de renda.
Cálculo feito pela MB Associados a pedido do G1 mostra que a queda do PIB neste trimestre sem o Auxílio Emergencial poderia chegar a 18,2%. Em suas previsões, a consultoria esperava uma queda de 11,7% no período – uma diferença, portanto, de 6,5 pontos percentuais. Segundo economistas, os auxílios do governo (que incluem também programas de estímulo como o Pronampe) fizeram o PIB brasileiro ter queda similar à de países desenvolvidos.
“Os programas de auxílio de renda ajudaram a manter certo padrão de consumo, especialmente das classes mais baixas de renda”, diz o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale.
“Se, em 2008, houve discussão sobre um uso mais agressivo de política monetária, dessa vez não havia alternativa a não ser o uso também agressivo da política fiscal”, afirma.
Ainda que tenha amortecido a queda, o auxílio teve ação limitada no período pelo fechamento da economia. Abril ficou marcado como mês mais difícil da crise não só pela redução de renda, mas pelo impedimento da produção pelas medidas de isolamento social para combater a disseminação da Covid-19.
Mesmo em maio e junho, quando fábricas e lojas começaram uma lenta reabertura, os ganhos setoriais foram desbalanceados. Ganhos do varejo foram mais consistentes que indústria e serviços.https://1bf6f6e9aaeb0e0b0cec622d7137a6bf.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.htmlhttps://datawrapper.dwcdn.net/RTAS0/1/
Principalmente no primeiro mês, mas também nos demais, a renda extra foi encaminhada para bens essenciais, como alimentos e farmácias, e parte extrapolou para pequenos reparos da casa, em materiais de construção, e renovação do ambiente doméstico, como eletrônicos e eletrodomésticos.
Sem uma ingerência maior do isolamento, a expectativa é de que os efeitos das injeções de recursos sobre o consumo fiquem mais claras no terceiro trimestre.
Na prática, os efeitos se mostram no exemplo de Hilderlania Alves: a estudante de 27 anos viu sua qualidade de vida melhorar desde abril, quando os rendimentos da casa subiram de R$ 1,3 mil para R$ 2,5 mil por mês.
Bolsista de um curso pré-vestibular, Hilderlania mora com a mãe, Luciana, e o pai, Arcádio, em Iguatu, interior do Ceará. Luciana Nunes tem 50 anos, é dona de casa e agricultora. A família deixou de receber o Bolsa Família quando tiveram acesso à aposentadoria por invalidez do pai, Arcádio Bezerra, de 55 anos, há mais de quatro anos.
Cada uma recebe R$ 600 do auxílio e já tiveram depositadas quatro parcelas do benefício.
“Melhorou bastante a nossa vida em vários aspectos. Estamos pagando as contas em dia, como luz e gás, que antes era bem difícil de conseguir. E estamos conseguindo comprar produtos que antes seriam inviáveis, além de melhorar a variedade de alimentos”, diz Hilderlania.
A estudante conta que sua família deixou de depender da disponibilidade dos medicamentos em postos de saúde e colocou na cesta de compras produtos de beleza, como cremes e maquiagens. O dinheiro também foi usado para manter os estudos, com novos materiais escolares e o novo plano de internet móvel no celular.
“Nossa alimentação tinha basicamente carboidratos e proteínas de valor mais acessível como frango, ovos e carne moída. Agora, temos uma alimentação mais saudável, com carne de primeira, fígado, queijo, costela bovina, linguiças, peixes e vegetais”, afirma.
Ainda que o futuro do programa esteja incerto, a família de Hilderlania tem consciência de que o auxílio, no modelo atual, vai acabar. Em um esforço extra, fazem o possível para guardar ao menos 10% da renda repassada pelo governo.https://1bf6f6e9aaeb0e0b0cec622d7137a6bf.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html
“Sabíamos que não seria por muito tempo. Pode ser que a vida fique pior, por conta das fragilidades econômicas geradas pela pandemia. Mas minha mãe está esperando que um novo programa social de renda seja implantado”, diz.