Mesquita
O que faz uma senhora, “mãe de família”, acreditar que a família brasileira está em risco porque um homossexual qualquer tomou hormônio para o seio crescer?
O que faz milhões de pais e mães de família que acreditarem que suas famílias estão em risco porque algumas pessoas escolhem usar roupas do outro sexo?
O que os faz sentir tão frágeis?
O discurso é que eles precisam salvar a família. A família está em risco.
Diálogo real:
A – “Eu tenho filhos, não quero que eles saiam na rua e vejam homens de mãos dadas.”
B – “O que você acha que pode acontecer com seus filhos?”
A – “Eles vão começar a achar que é normal, daí você já sabe?”
B – “Seus filhos podem ficar igual a estes homens?”
A – “É sempre uma tentação, não é?”
B – “Não é não. Nunca tive medo dos meus filhos quererem “dar a bunda” porque tem homens por aí andando de mãos dadas”.
A – “É perigoso. Eles querem fazer a cabeça das crianças…”
B – “Porque seus filhos vão seguir a cabeça destes homens que eles nem conhecem? O que tem de errado DENTRO da sua casa?
A – fica brava, nervosa e começa a criticar o “mundo”.
A verdade é simples: estas pessoas mais conservadoras estão se sentindo extremamente inseguras. Elas sentem que suas vidas estão em risco por causa das escolhas sexuais e afetivas de outras pessoas. Mas, de fato, as escolhas afetivas e sexuais de outras pessoas não significam risco. Elas estão, portanto, com um distúrbio de percepção.
A origem do distúrbio de percepção
A maior parte das famílias conservadoras aderiram a alguma vertente da “Teologia da Prosperidade”. Por esta teologia, quando a pessoa “se entrega” a Deus, sua vida pessoal, familiar, econômica e saúde fica melhor.
A força desta Teologia da Prosperidade é tão grande que ela se infiltrou fortemente nas crenças religiosas que estão crescendo no Brasil. Seja no espiritismo, no budismo, nos evangélicos, nos católicos, nos que são “espirituais, mas não religiosos”.
Crenças do tipo: Jesus cura, você nasceu para ser feliz, lei da atração, o que você pensa você materializa, etc. Milhões de mensagens motivacionais que são repetidas nas redes sociais…
Quanto mais a pessoa se sente impotente, mais ela se agarra à teologia da prosperidade. O desejo dela é ter grandes benefícios para sua vida melhorar.
O problema: ela NÃO consegue. Sua vida não muda. Quando muda, ela considera insuficiente.
Uma pessoa foi para a igreja, começou a orar e foi “abençoada por Deus” com um apartamento do programa Minha Casa, Minha Vida. Depois veio a crise e… alguém, que não é Deus e nem ela, tem que ser o culpado…
O materialismo da Teologia da Prosperidade
Estas pessoas mais conservadoras querem benefícios concretos. Elas usam a “espiritualidade” para conseguirem benefícios materiais. Dinheiro, emprego, cura. Querem se sentir especiais. Veja a frase: “se você não recebeu ainda é porque Deus está preparando algo melhor para você”. Ela se sente superespecial!
Estas pessoas se entregaram ao consumismo, ao desejo, à vaidade e ao orgulho. Ou seja, elas se transformaram em máquinas de insatisfação.
Basicamente: elas estão insatisfeitas, na família delas reina a insatisfação.
O que fazem pessoas insatisfeitas? Buscam outras opções de vida.
Por isto a mulher hiperconservadora disse: “É sempre uma tentação, não é?”
Conclusão: a tentação dentro dela é enorme porque sua insatisfação é grande. Ela fez escolhas e estas escolhas estão levando-a não identificar os VERDADEIROS causadores de sua insegurança. Por isto acusam outras pessoas que são diferentes delas.
Outros valores são possíveis
Todo mundo quer viver melhor. A questão é: como e cultivando quais valores?
A Teologia da Prosperidade é uma espécie de funk ostentação da espiritualidade. Promete muito, sonha muito e realiza pouco.
Realiza pouco, por isto a grande insatisfação. Se estas pessoas continuarem a usar a religião ou a espiritualidade para, principalmente, receberem benefícios materiais ou orgulhosos, elas sempre estarão insatisfeitas. Suas famílias estarão insatisfeitas e a hipocrisia será a maior fonte de desestímulo para prosseguir em sua fé.
O materialismo, o consumismo e a hipocrisia é que desestimulam a fé. Não é o homossexual do bairro, como não era a prostituta que foi salva por Jesus.
Para cultivar outros valores basta seguir os verdadeiros ensinamentos de Jesus. Com certeza, haverá mais paz e mais segurança na família conservadora brasileira.
Outros valores, outros interesses
O que é mais importante: o rapaz do bairro que toma hormônio para crescer os seios ou o alimento que chega ao prato contaminado com venenos e vários outros produtos químicos?
Qual é capaz de atrapalhar sua família? O que acontece com uma criança contaminada por venenos?
Qual o efeito dos produtos químicos sobre a motivação e o psiquismo de seus filhos? (1)
A alimentação natural, por exemplo, é uma forma de respeito. Um dos ensinamentos de Jesus foi o respeito. Podemos criar uma agricultura saudável e todos os seres vivos serão beneficiados.
O filho ser envenenado por venenos e outros produtos químicos não é visto como um risco para a família conservadora. Ela presta muito mais atenção aos símbolos de status do que aos reais ensinamentos de Jesus.
A família conservadora brasileira vive o ter, Jesus valorizou o ser.
A família conservadora não faz as mesmas escolhas que Jesus. Se houver a Opção Pelo Amor, a mulher não vai gastar seu tempo julgando os outros. A Opção Pelo Amor inclui termos: colaborar, compartilhar, servir, cooperar, ajudar, sacrifício, privação voluntária, etc.
A grande satisfação do ser humano não vem do desejo, nem do orgulho, nem do consumismo, nem da vaidade; nem de ilusões que levam às desilusões.
A grande satisfação do ser humano vem da gratidão, da compaixão, da benevolência, do servir, do altruísmo, etc. Vem do ato de aproveitar qualquer oportunidade da vida para projetar para fora o amor que ele possui dentro de si. Foi isto que Jesus ensinou e praticou.
A Teologia da Prosperidade ensina o materialismo, o consumismo e a hipocrisia. O resultado é a insatisfação e a fragilidade da fé. Por este motivo é verdade que a família conservadora brasileira está em risco. Muito risco!
(1) Os conservadores, no Congresso, são aliados entre si-mesmos. Todos apoiam a maior liberdade de uso e liberação de agrotóxicos, todos são a favor de leis “a favor da família”. Eles se apoiam mutuamente.
(*) É o autor do Blog Psicologia Racional e da coluna “Comportamento Humano” no site Carta Campinas