A tecnologia agiliza o diagnóstico de problemas na gravidez e poderia ser implementada em locais remotos do país
Com taxa de 93% de acertos quando comparada com médicos, a tecnologia agiliza o diagnóstico de problemas na gravidez e poderia ser implementada em locais remotos do país, que não contam com especialistas, afirmam os pesquisadores.
Desenvolvido pelo Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) e por profissionais do grupo de saúde Dasa, o algoritmo consegue identificar nas imagens o que é líquido amniótico, uma substância que ajuda a proteger o feto e que também colabora no desenvolvimento dele durante a gestação.
Heron Werner, médico responsável pela medicina fetal da Dasa do Rio de Janeiro e um dos integrantes do grupo, explica que mensurar a quantidade do líquido amniótico é importante porque isso se reflete no bem-estar do feto. “A dinâmica do líquido amniótico para mais ou para menos pode nos nortear em procurar alguma patologia no bebê”, afirma.
A nova tecnologia pode, por exemplo, ajudar no diagnóstico de obstrução no esôfago, um problema que impede o feto de beber o líquido –com isso, a quantidade da substância no útero aumenta, o que pode ser visto na ressonância, diz o médico. Ela também consegue perceber disfunções no sistema urinário do bebê, já que isso diminui a quantidade de líquido amniótico que aparece nas imagens.
Para chegar a essas conclusões, os pesquisadores usaram 700 imagens em 3D de ressonâncias magnéticas. Elas foram utilizadas para treinar a inteligência artificial, que foi auxiliada ainda por uma tecnologia chamada redes neurais convolucionais.
Com essas redes neurais, o algoritmo consegue visualizar vários exemplos do que deve aprender e, a partir daí, evolui constantemente.
Paulo Orenstein, pesquisador do Impa e coordenador do projeto, afirma que o aprendizado também se dá pelas tentativas que o algoritmo faz. “A gente vai guiando sobre quais desses chutes são bons e quais são ruins, e dessa maneira, eventualmente, ele começa a aprender algumas maneiras de detectar o líquido amniótico nas imagens”, explica ele.
Em um momento da pesquisa, por exemplo, o algoritmo apontou que uma área de uma das ressonâncias era de líquido amniótico. Quando um médico analisou o caso, porém, percebeu que, na realidade, o que havia ali era um cisto.
O pesquisador, então, avisou a máquina sobre o erro e ela passou a entender que áreas como aquela não são líquido amniótico, o que melhorou sua capacidade de análise.
Para o futuro, a ideia dos pesquisadores é conseguir fazer o algoritmo evoluir para interpretar também outros órgãos do bebê, como o cérebro. Mas, para isso, será necessário fornecer dados diferentes dos que são usados atualmente.
Embora a tecnologia utilizada nos dois casos seja semelhante, a inteligência artificial precisa aprender as características específicas de cada órgão que vai analisar, explica Orenstein.
“Quando medimos a cabeça do bebê, a gente também mede o osso [do crânio]. O que nós queremos é criar uma maneira de calcular com precisão o volume do tecido cerebral. Então, [a evolução do algoritmo] seria uma forma mais fidedigna de medir o desenvolvimento do sistema nervoso central do bebê”, diz Werner.
A pesquisa faz parte do Centro Pi (Projetos e Inovação) do Impa, uma estrutura que tenta aproximar o instituto de entidades públicas e privadas.
Além da parceria com a Dasa, outros trabalhos desenvolvidos pela iniciativa incluem um projeto no Ministério Público da Paraíba para detectar, por meio de recursos matemáticos, a manipulação dos preços de produtos.
Marcelo Viana, diretor-geral do Impa e colunista da Folha, afirma que existem algumas razões para o desenvolvimento dessas iniciativas, como devolver à sociedade os investimentos feitos no instituto, profissionalizar ainda mais os pesquisadores e angariar novos recursos financeiros.
“A principal dificuldade é as empresas saberem o que a matemática pode fazer por elas e por isso foi importante o Impa adotar essa postura proativa [por meio do Centro Pi]”, afirma Viana.