Xangai está sob lockdown desde o final de março. Como sabemos, a China é uma ditadura, e somente nesse tipo de regime, é imaginável e possível confinar de forma quase absoluta o equivalente a duas vezes a população da cidade de São Paulo. Fora o evidente autoritarismo da medida, há sérias dúvidas sobre se isso é cientificamente justificável.
Já vimos isso quando a também chinesa megalópole de Wuhan (epicentro inicial da pandemia) ficou isolada 76 dias, enquanto a Covid-19 se espalhava rapidamente pelo mundo, causando até agora mais de 6 milhões de mortes. Impossível, no entanto, ignorar os excessos que foram cometidos.
Desta vez, essa “política dinâmica da Covid zero” (como o governo batizou o esquema) chegou ao excesso de obrigar centenas de pessoas que circularam por um shopping center a se trancarem em casa por dez dias após um único cliente ter o caso notificado.
Talvez graças ao rigor extremo das medidas de isolamento – e após vacinar cerca de 90% de seus cidadãos – a China apresente um baixíssimo número de óbitos por Covid. Mesmo assim, o governo de Xi Jinping cogita aplicar as mesmas medidas drásticas na gigantesca Pequim. Cabe ressaltar que a capital do país registrou terça (26) e quarta (27, respectivamente, 34 e 50 casos positivos.
Analistas dizem que em Pequim o negócio será mais brando. A explicação é política. No segundo semestre acontece o Congresso do Partido Comunista, e o líder chinês quer esticar seu mandato (pela terceira vez). Não seria bom para os planos do longevo presidente se houvesse gente na maior cidade do país reclamando de um lockdown (mesmo com o certo risco de ser preso por isso, como sabemos).
Longe de qualquer teoria conspiratória, é o caso de todos se perguntarem o que de fato está acontecendo por lá, o quanto as informações oficiais são confiáveis e, principalmente, qual o risco real de estarmos diante de uma nova (e assustadora?) variante do coronavírus. O planeta estaria preparado para mais uma imensa onda de contágio?
Não, não é catastrofismo, algum tipo de síndrome de pânico ou especulação irresponsável. Essa hipótese tem de estar no radar de todos os povos. Não podemos novamente cometer o erro de menosprezar a dimensão do que o governo chinês está promovendo. Nem ceder à xenofobia rasteira (ou estreitamento ideológico) de que os chineses estão patrocinando propaganda “terrorista” (lembram?), e deixarmos de nos precaver.
Algo muito sério está acontecendo na China. E isso é de interesse de toda a comunidade internacional. É grande a tentação de naturalizar novas notícias sobre a pandemia, se acomodar diante de também inquestionáveis números que indicam que a pandemia está sob controle. Ou restringir esse esforço imenso dos chineses a notas de rodapés e se acomodar à espera de algum alerta da Organização Mundial de Saúde. Ficar atento e de prontidão: será que a dura lição que já tivemos serviu para alguma coisa?
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