Postagens nas redes sociais acendem alerta em razão da desinformação. Medicação só deve ser usada como contraceptivo de emergência quando o método convencional falhar.
Por Poliana Casemiro, g1
Setenta e duas pílulas do dia seguinte em três meses. Pílula do dia seguinte tomada todos os dias como anticoncepcional convencional. Essas são algumas das histórias compartilhadas por jovens nas redes sociais em vídeos que somam milhões de visualizações. Verídicas ou não, essas postagens acendem um alerta por conta da desinformação. Médicos ressaltam que usar a pílula do dia seguinte dessa forma não é seguro para prevenir gravidez nem tampouco para a saúde da mulher.
👉 A pílula do dia seguinte é uma dose de progesterona – um hormônio feminino – para ser utilizada como contraceptivo de emergência quando o método convencional (camisinha, anticoncepcional, injeção) falhar.
Nas histórias viralizadas, as jovens relatam complicações como AVC (acidente vascular cerebral, quando vasos que levam sangue ao cérebro entopem ou se rompem) e hemorragia pelo uso da pílula do dia seguinte de forma recorrente.
Os médicos, porém, alertam que, desde que tomada na quantidade indicada, NÃO há qualquer evidência de que a medicação possa causar essas complicações.
Falta de informação e medo dos pais
Segundo ginecologistas, o uso da medicação de emergência é comum entre adolescentes por dois motivos basicamente:
- falta de informação sobre métodos contraceptivos adequados;
- receio de tomar anticoncepcional contínuo e os pais descobrirem que mantêm relações sexuais.
No entanto, as adolescentes não precisam de acompanhamento dos responsáveis para ter acesso a contraceptivos, incluindo o DIU.
Essas meninas se colocam nessa situação por falta de orientação, por medo de pai e mãe, mas, a partir dos 14 anos, não precisa de acompanhante para a consulta de aconselhamento contraceptivo. Ninguém precisa saber. E a proteção delas é a prioridade, não importa o que o namorado diz.
— Mariane Nadai, ginecologista e membro da comissão anticoncepção da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia)
Pílula do dia seguinte é método de emergência. — Foto: Divulgação/Reproductive Health Supplies Coalition
Pílula do dia seguinte previne gravidez?
A pílula do dia seguinte surgiu no Brasil em 1999 para impedir a gravidez em casos específicos, como com o rompimento do preservativo na hora da relação, se a mulher esqueceu de tomar o anticoncepcional ou em casos de violência sexual. Ou seja, funciona, mas como emergência porque há variáveis.
👉 Como é a ação da pílula: o remédio tem uma dose de progesterona que age no corpo atrasando a ovulação em até 48 horas para impedir que o espermatozoide encontre o óvulo e a mulher engravide.
🚨 Atenção: A pílula não funciona caso a mulher já tenha ovulado e é importante ressaltar que ela não tem efeito abortivo.
🎯 Os médicos explicam que a pílula é eficaz, mas, em razão da ovulação, não é um método seguro para prevenir a gravidez e para ser considerada como a única forma contraceptiva.
Ela só funciona se a paciente não tiver ovulado ainda e precisa ser tomada o mais breve possível com limite de 72 horas da relação. Depois disso, e se já tiver ovulado, ela não funciona. Por isso que a gente precisa reforçar que é um método de emergência.
— Carolina Cunha, ginecologista da Beneficência Portuguesa
Ou seja, os critérios para a pílula ser eficaz são:
- tomar a medicação até 72 horas após a relação sexual; e
- não ter ovulado ainda.
Tocofobia: a doença de quem tem pânico de engravidar
Existe um limite seguro para o corpo?
Nos vídeos viralizados, as meninas dizem tomar dezenas de unidades em curto espaço de tempo.
O que os médicos explicam é que a pílula não é uma bomba de hormônio e não tem efeitos colaterais graves quando tomada na quantidade indicada na bula.
⛔ Em volume além do indicado, não há segurança.
O ponto é que a gente só tem estudo do que é testado, que é a pessoa tomar uma pílula. Ninguém testou em uma quantidade dessas porque isso não é indicado, ela não é eficaz. Então, não dá para saber o que vai acontecer com o paciente. É importante que não façam isso.
— Carolina Cunha, ginecologista
A ginecologista da Febrasgo Mariane Nadai também reforça que tomar várias pílulas não é indicado.
“Nenhum médico vai indicar 30 comprimidos em um mês. A pílula do dia seguinte não é anticoncepcional de uso diário. Se o médico não indica, não pode ir no que o namorado fala, no que vê na internet. Na quantidade indicada, não tem risco. Nessa quantidade enorme, a gente não tem como saber”, diz.
O que fazer para evitar usar a pílula do dia seguinte?
Os médicos ressaltam que é preciso ter um método contraceptivo eficaz para prevenir a gravidez e, assim, não precisar da pílula do dia seguinte ou utilizar a medicação apenas em casos de emergência.
“A pílula é muito usada por adolescentes que muitas vezes não querem contar aos pais que têm uma vida sexual ativa e, por isso, não vão ao ginecologista. Mas isso é mito! A partir dos 14 anos pode ir desacompanhada para a consulta e o contraceptivo é indicado sem a necessidade da autorização dos pais”, explica a ginecologista Mariane Nadai.
Os ginecologistas ainda reforçam que a prioridade é a segurança da mulher e que o parceiro não pode interferir na escolha do método e que quando há recusa em usar preservativo, por exemplo, é um sinal de atenãosobre o relacionamento.
Tocofobia
Outro ponto para o qual os médicos chamam a atenção é o medo excessivo de engravidar: a tocofobia.
Por causa do pânico, as mulheres associam vários métodos contraceptivos e chegam a usar a pílula do dia seguinte como reforço do anticoncepcional. Mas isso não tem eficácia! O anticoncepcional já impede a ovulação.
Hoje, existem opções de LARC (traduzido do inglês, contracepção de longa duração) e que não tem ação comportamental. Ou seja, não depende da mulher o controle ou lembrar de tomar. São eles o DIU, SIU e os implantes.