A jornalista Glória Maria morreu nesta quinta-feira (02/02), após passar os últimos quatro anos tratando um câncer de pulmão.
De acordo com informações divulgadas pela Rede Globo, Glória Maria havia sido tratada, a princípio, com imunoterapia, uma alternativa que foca em combater o câncer por meio de modificações no próprio sistema imunológico do paciente, o que é feito com medicações injetadas na veia.
Na época, o tratamento teve sucesso, mas, mais tarde, o câncer voltou e se espalhou pelo cérebro, criando as chamadas metástases. Os tumores no cérebro foram retirados com cirurgia, mas novos focos da doença apareceram.
Em 2022, de acordo com a Globo, “a jornalista iniciou uma nova fase do tratamento para combater novas metástases cerebrais que, infelizmente, deixou de fazer efeito nos últimos dias”.
Câncer de pulmão e metástases no cérebro
A metástase acontece quando células cancerígenas são disseminadas por meio da corrente sanguínea ou linfática.
Os pulmões são órgãos altamente vascularizados, o que favorece essa disseminação das células cancerígenas para outras partes do corpo.
Além disso, a anatomia do pulmão também contribui para um quadro de metástases cerebrais.
“As veias pulmonares mandam o sangue oxigenado para o coração, que distribui para todo o corpo através das artérias. Se há células cancerígenas no local, é mais fácil, em relação a outros tipos de cânceres, que elas cheguem no sistema nervoso central”, explica Gustavo Prado, pneumologista e coordenador da Comissão Científica de Câncer de Pulmão da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia).
Em casos de câncer de pulmão metastático, um estudo publicado na revista científica Current Oncology estima que entre 20 a 40% são metástases cerebrais.
“Historicamente, a sobrevivência de pacientes com metástases tem sido considerada muito ruim, com alto risco de morte e prejuízos significativos na qualidade de vida. A sobrevida média de pacientes com metástases no cérebro não tratadas é entre 1 e 3 meses”, descreve o estudo.
Por que é tão difícil tratar um câncer metastático?
A presença de metástases, aponta Prado, já sinaliza que a doença está não controlada.
“Também vale ressaltar que o sistema nervoso central é uma região particularmente mais difícil de se tratar com medicamentos, já que não são todos que atingem uma uma boa distribuição”, afirma.
“Há uma barreira, chamada de hematoencefálica, que funciona, normalmente, como uma proteção que dificulta a passagem de substâncias do sangue para o sistema nervoso central, mas nesse caso, dificulta a absorção dos remédios.”
Outro fator, de acordo com o médico, é a possibilidade de existirem lesões que exames de imagem não captam.
“Microlesões podem estar presentes, só ainda não atingiram uma dimensão suficiente para que os exames consigam detectar.”
Câncer de pulmão está entre os tipos mais comuns no Brasil
De acordo com o Inca (Instituto Nacional de Câncer), o câncer de pulmão é o segundo mais comum em homens e mulheres no Brasil, representando 4,6% dos casos de tumores malignos e ficando atrás apenas do câncer de pele não melanoma.
O câncer de pulmão é uma doença que não dá sinais em seus primeiros estágios.
“Quando os sintomas aparecem, é comum que a doença já tenha atingido um estágio avançado, o que reduz as chances de cura e compromete a qualidade de vida do paciente”, indica Clarissa Mathias, oncologista do Grupo Oncoclínicas e coordenadora da liga de oncologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia).
A médica comenta ainda que existem dois tipos principais de câncer de pulmão: carcinoma de pequenas células e de não pequenas células.
“O carcinoma de não pequenas células corresponde a 85% dos casos e se subdivide em carcinoma epidermóide, adenocarcinoma e carcinoma de grandes células. O tipo mais comum no Brasil e no mundo é o adenocarcinoma e atinge 40% dos doentes.”
Gustavo Prado, pneumologista da SBPT, lembra que há muitos subtipos entre os cânceres de pulmão, mas que apesar de poderem apresentar características diferentes entre eles, há uma mensagem importante que vale para todos.
“Quanto mais precoce for o diagnóstico, maior é a chance de cura para o paciente. No entanto, em qualquer momento em que a doença for diagnosticada há benefício em ser acompanhado por especialistas, porque temos recursos importantes para melhorar a qualidade de vida mesmo em pacientes com doença avançada.”
Quais os sinais iniciais desse tipo de câncer?
De acordo com Mathias, a maioria dos pacientes com câncer de pulmão apresentam sintomas ligados ao aparelho respiratório. Entre os sinais mais comuns, a oncologista cita:
- Tosse persistente e rouquidão
- Falta de ar
- Fadriga
- Escarro com sangue;
- Dor no peito;
- Dor nos ossos
- Dor de cabeça;
- Perda de peso e de apetite;
- Pneumonia recorrente ou bronquite;
- Efusão pleural (acúmulo anormal de líquido na pleura);
Se ocâncer de pulmão é silencioso, como diagnosticá-lo precocemente?
Apenas cerca de 25% dos casos são diagnosticados precocemente. Para a maioria, o câncer de pulmão é descoberto quando já tem um tamanho grande, está disseminado pelo tórax ou apresenta metástases em outros órgãos.
“Por isso, uma das medidas mais efetivas que temos é controlar o principal fator de risco, o tabagismo, por apoio a quem precisa parar de fumar e medidas públicas para dificultar que outras pessoas iniciem o hábito, como elevação de impostos e tributos para cigarros e proibição do fumo em locais públicos”, diz o médico da SBPT.
Ser fumante passivo (inalar fumaça do cigarro de outras pessoas), viver em meio à grande quantidade de poluição ambiental e ter exposição à substâncias como amianto, arsênico, asbesto e radônio também são fatores que aumentam o risco da doença.
Para o diagnóstico precoce, o médico aponta que o encaminhamento de achados incidentais contribuem muito para começar um acompanhamento em fases iniciais da doença.
“Tomografias pedidas por outras razões que não a investigação específica do câncer de pulmão, por exemplo, podem apontar a presença de nódulos, e assim inicia-se uma investigação oportuna.”
Além disso, Prado ressalta que é essencial manter um rastreio ativos de pessoas consideradas dentro do grupo de risco, especialmente após os 50 anos. BBC