Guedes nega que PEC dos precatórios seja calote e diz que dívidas menores de R$ 450 mil serão pagas à vista
‘Devo não nego, pagarei assim que puder’, disse o ministro. Proposta será encaminhada ao Congresso. Dívidas de precatórios da União chegarão a R$ 90 bilhões em 2022, segundo o Judiciário.
Por Jéssica Sant’Ana, G1
O ministro da Economia, Paulo Guedes, negou nesta terça-feira (3) que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios seja um calote e que dívidas menores de R$ 450 mil poderão ser pagas à vista. Previsão é a de que a proposição seja apresentada nos próximos dias pelo governo ao Congresso.
Precatórios são dívidas da União decorrentes de decisões judiciais definitivas, ou seja, que não são mais passíveis de recursos. O governo vai apresentar a PEC para ampliar a possibilidade de parcelamento desses créditos que pessoas físicas e jurídicas têm a receber do governo federal.
“Calote não há […] E os maiores terão uma alternativa de usar um poder liberatório para acelerar a transformação do estado brasileiro [o fundo dos precatórios]”, disse Guedes durante evento on-line organizado pelo portal Poder360 e Instituto Brasiliense de Direito Privado (IDP).
“Esses direitos são títulos, devo, não nego, pagarei assim que puder, inclusive estou criando esse fundo para que vendendo as estatais vocês possam usar mais rápido possível”, afirmou o ministro.
O ministro disse ainda que o governo já fez as contas e será possível quitar à vista e integralmente todos os precatórios menores de R$ 450 mil nos próximos anos.
“Só os maiores precatórios, de 450 mil pra cima, e os ‘superprecatórios’ serão parcelados”, afirmou Guedes.
‘Meteoro’
O Ministério da Economia foi informado pelo poder Judiciário que os precatórios vão somar R$ 90 bilhões em 2022, ante os R$ 55 bilhões orçados neste ano. O valor ficou acima do esperado pelo Executivo, que era algo também em torno de R$ 50 bilhões.
O montante informado pelo Judiciário consumiria todo o espaço no teto de gastos para criação do novo programa social, além de contrair outras despesas não discricionárias, como investimentos.
“O governo opera com R$ 96 bilhões de despesa discricionária [não obrigatória, como investimentos e funcionamento da máquina pública]. O ‘meteoro’ [a conta dos precatórios para 2022] são R$ 90 bilhões, isso remove as possibilidades de funcionamento do governo”, afirmou o ministro.
‘Superprecatórios’
A PEC pretende permitir o parcelamento dos “superprecatórios”, ou seja, acima de R$ 66 milhões. A União pagará 15% da dívida à vista e o restante em nove parcelas anuais. Já os precatórios de até 60 salários mínimos, ou seja, de até R$ 66 mil serão pagos à vista, integralmente.
Os precatórios que ficarem acima de R$ 66 mil e abaixo de R$ 66 milhões serão quitados de acordo com a capacidade de pagamento anual da União. A PEC vai propor um teto anual para pagamento dos precatórios, provavelmente atrelado a um percentual da receita corrente líquida, para dar mais previsibilidade ao governo.
“Os superprecatórios já estão parcelados, os pequenos terão garantido o atendimento pronto e imediato. Mas suponhamos que eu já paguei todas as requisições de pequeno valor [precatórios até R$ 66 mil], e que dentro desse limite anual dê para pagar todos esses pequenos valores, e certamente deu, já fizemos as contas, e há espaço para apagar mais, então vamos subindo em ordem ascendente de valor”, explicou Guedes.
Para acelerar o pagamento dos precatórios intermediários, a PEC vai propor também a criação de um fundo a ser abastecido com recursos de privatizações e venda de imóveis e demais patrimônios da União.
“O que estamos fazendo é transformar uma crise em uma oportunidade de transformar o Estado. Temos que fazer como fazem todos os cidadãos, vende casa de campo, carro”, exemplificou o ministro da Economia.
Guedes disse, ainda, que não se trata de uma manobra ao teto de gastos, pois entende que os precatórios são gastos extraordinários, portanto poderiam ser pagos também com recursos das desestatizações.
O ministro da economia disse também que a PEC assegura previsibilidade para a gestão orçamentária.
“Poderes são harmônicos, não podemos entrar no mérito das decisões judiciais, mas a dimensão econômica tem que ser preservada, porque há capacidade de pagamento [do estado]. O risco que você tem é ninguém receber nada, ir para o caos financeiro, abismo fiscal. Temos que produzir juntos essa solução que dê previsibilidade”, defendeu o líder da equipe econômica.
Repercussão
Ainda durante o evento virtual, Guedes revelou que a ideia da PEC foi do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que também participou do evento e disse que este é um “momento de engenharia institucional ampla para enfrentar problema posto e bastante grave”.
“Os parcelamentos se fazem independentemente de PEC, temos que encarar isso dessa forma. Estamos tendo uma nova oportunidade de discutir essa questão, esse é um momento de engenharia institucional ampla para enfrentar problema posto e bastante grave”, disse o ministro do Supremo ao lembrar que a possibilidade de ampliação dos parcelamentos dos precatórios já foi discutida em 2009, mas depois impugnada pelo Supremo.
Gilmar Mendes defendeu também uma atuação mais proativa do governo e da advocacia-Geral da União (AGU) para buscar acordos em relação às dívidas da União, evitando assim a judicialização.
“A própria lei de responsabilidade fiscal tem a determinação de que haja relatório de riscos fiscais, para que isso seja devidamente avaliado. É fundamental que em muitos casos haja conduta proativa do estado para evitar situações como essa que estamos a enfrentar”, afirmou o ministro do Supremo.
A minuta da PEC foi discuta na segunda-feira (2) pelos ministros da Casa Civil, Ciro Nogueira; da Economia, Paulo Guedes; da Secretaria de Governo, Flávia Arruda; e da Cidadania, João Roma, com os presidentes da Câmara e do Senado Federal, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, respectivamente. A data de envio da PEC pelo governo não foi definida.