Bancos e consultorias voltaram a revisar para baixo as projeções para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e parte dos analistas já dá como certa uma retração da atividade, o que não ocorre desde 2016.
Por Luiz Guilherme Gerbelli, G1
A economia brasileira caminha para uma recessão neste ano. Com o impacto do coronavírus, bancos e consultorias voltaram a revisar para baixo as projeções para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) e parte dos analistas dá como certa uma retração da atividade, o que não ocorre desde 2016. Para a maioria deles, a dúvida já é de qual vai ser o tamanho da queda.
O avanço do coronavírus tem provocado uma paradeira na economia global e nacional. Parte da população está isolada em casa, o varejo baixou as portas para ajudar a conter a propagação do vírus, e fábricas tiveram de interromper ou reduzir a produção. Na ponta, o resultado dessa combinação perversa são as demissões anunciadas pelas empresas, o que vai piorar o quadro do emprego no país.
Na rua 25 de março, em São Paulo, comércio fechado na sexta-feira (20) para evitar a propagação do novo coronavírus — Foto: Marcelo Brandt/G1
A última vez que o mundo sentiu um impacto tão grande foi na crise financeira de 2008. No Brasil, a doença chegou num momento muito ruim. Os últimos números da economia no ano passado já apontavam para uma perda de ritmo. Antes de o surto se propagar, as projeções para o desempenho do PIB neste ano já estavam sendo reduzidas, já próximas a uma expansão de 1,5%.
“A crise global de 2008 era uma crise financeira e chegou, inicialmente, de uma maneira indireta no dia a dia do Brasil”, diz o economista-chefe do banco BNP para o Brasil, Gustavo Arruda. “Agora, é uma crise com impacto direto na atividade.”
Na leitura dos analistas, o estrago maior na economia brasileira deverá ser observado no segundo trimestre, quando os efeitos da paralisação da economia serão sentidos de forma mais intensa. “Parece que o efeito maior da crise se dará, de fato, no segundo trimestre, em que o contágio atingirá seu pico”, escreveu em relatório o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale.
Nas projeções da MB Associados, a atividade econômica deve recuar 0,3% no primeiro trimestre de 2020 na comparação com os últimos três meses do ano passado. No segundo trimestre, o tombo deve ser de 6,5%.
No caminho da recessão — Foto: Economia G1
Tamanho do tombo
Por ora, tem sido difícil apontar qual será o real tamanho da recessão esperada para este ano. A única certeza é de que houve uma deterioração acentuada da economia nos últimos dias. A dificuldade de se dá porque é impossível saber qual será a duração do isolamento social no país.
Um exercício da consultoria Tendências deixou bem claro como o PIB pode variar neste ano a depender dos dias de isolamento. O cenário-base da consultoria é de uma retração da atividade econômica de 1,4%, num quadro em que 22 dias úteis serão perdidos com a paralisação.
Num cenário otimista, com apenas nove dias úteis desperdiçados, o Brasil ainda poderá crescer 0,2%. Num quadro pessimista, com 32 dias úteis comprometidos, o PIB deve despencar 3,3%.
“No último trimestre, já houve uma frustração, a economia cresceu menos do que o esperado”, afirmou a economista e sócia da consultoria Tendências, Alessandra Ribeiro. “Antes do coronavírus, já havia essa frustração. Agora, o crescimento vai ser mais fraco do que se imaginava.”
Na semana passada, o Itaú também fez um exercício parecido, de como o resultado da economia pode variar, a depender do impacto do coronavírus. O banco estima que o PIB deve recuar 0,7% neste ano, levando em conta que o Brasil tenha um bloqueio equivalente a 75% do chinês.
Se o impacto for equivalente a 100% do bloqueio chinês, a queda do PIB brasileiro será de 1,6%. Num cenário mais positivo, em que o choque é de apenas 50% do observado na China, o Brasil ainda poderá colher um crescimento de 0,2%. “É uma crise que parece ser temporária. O produto cai muito e depois volta para o patamar em que deveria estar”, disse o economista-chefe do banco Itaú, Mario Mesquita.
O banco estima que o PIB do segundo trimestre deve recuar 9,6% no segundo trimestre na comparação com os três meses anteriores, com uma recuperação de 11,9% no período de julho a setembro.
Piora do mercado de trabalho
A volta da recessão no Brasil – a última foi em 2016 – também vai marcar uma reversão no mercado de trabalho. Os números do emprego até mostravam uma tímida melhora, mas os analistas já voltaram a projetar uma piora do quadro.
O banco UBS, por exemplo, estima que a taxa de desemprego medida pela Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios Contínua Mensal, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), deve encerrar o ano em 12,5%, nos dados dessazonalizados. Em janeiro, a desocupação ficou em 11,2%, com 11,9 milhões desempregadas.
“O desemprego encerrou o ano passado melhorando, mas este ano deve terminar com uma piora, subindo”, afirmou Fabio Ramos, economista do UBS Brasil.
O quadro de trabalho também traz preocupações porque uma parcela importante da força de trabalhado está na informalidade – eram 38,3 milhões de trabalhadores em janeiro. Esse contingente deve sofrer com um impacto na renda diante da paralisação de toda a economia.
“Certamente o mercado de trabalho vai piorar, sobretudo quando a gente pensa em ocupação. A nossa projeção era de um crescimento de 1,6% da ocupação neste ano, mas vamos rever este número para baixo”, disse Alessandra, da Tendências.
Medidas do governo
A equipe econômica tem anunciado uma série medidas para tentar mitigar os efeitos da pandemia do coronavírus na atividade econômica. O Banco Central reduziu novamente a taxa básica de juros e já disponibilizou R$ 1,2 trilhão para o sistema bancário tentar manter o mercado de crédito funcionando.
O governo também propôs um auxílio mensal de R$ 200 para trabalhadores autônomos. Com o aumento de gastos para combater o coronavírus, o rombo do governo também deverá ser maior.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, anuncia medidas emergenciais contra o coronavírus — Foto: Reprodução/GloboNews
A MB Associados estima que o déficit vai dobrar neste ano em relação ao previsto inicialmente: vai passar de R$ 103 bilhões para R$ 206 bilhões. Nesse ritmo, a dívida bruta do governo vai avançar de 76,9% do PIB para 80,8% do PIB.
“Tudo que poderá ser feito, de qualquer maneira, não conseguirá impedir a queda contratada do PIB este ano”, afirmou Vale.