Tão importante como trabalhar é saber parar. Com isso em mente, estivemos à conversa com o psiquiatra Pedro Morgado, que explica a importância do descanso e que impacto tem na saúde do nosso cérebro e qualidade de vida.
Échegado o período pelo qual anseia durante todo o ano e não é para menos. Mas depois chegam as férias e não consegue ‘desligar’. Passa os dias a um ritmo alucinante. São os e-mails do trabalho a cair, o telefone a tocar e as notificações do WhatsApp que não param. Este cenário é-lhe familiar? Pois bem, está na hora de deixar o sentimento de culpa em casa e fazer algo pela sua saúde.
Em entrevista ao Lifestyle ao Minuto, o psiquiatra Pedro Morgado lembra que estes comportamentos afetam bastante a nossa saúde física e mental. “É muito importante ‘desligar’ temporariamente do trabalho e usufruir de momentos de descanso e lazer”, reconhece o especialista, que está associado à campanha ‘Viva! Para lá da depressão’, uma iniciativa que tem o objetivo de promover a literacia dos portugueses relativamente à saúde mental.
“Se não descansarmos adequadamente, o nosso organismo não recupera a energia necessária, podendo entrar num estado continuado de fadiga e stress”, alerta. Como consequência, “existe um risco aumentado de desenvolvimento de doenças psiquiátricas”.
Qual é a importância do descanso?
O descanso é um estado de relaxamento físico e mental que ajuda a recuperar energia, aliviar a fadiga e a reduzir o stress. O descanso pode acontecer em estado de vigília ou no estado de sono.
O que acontece quando não descansamos adequadamente?
Se não descansarmos adequadamente, o nosso organismo não recupera a energia necessária, podendo entrar num estado continuado de fadiga e stress. Como consequência, existe um risco aumentado de desenvolvimento de doenças psiquiátricas.
Se sentimos que estamos a sofrer demasiado com as exigências da vida, devemos falar sobre o assunto com um amigo ou familiar e, de seguida, procurar avaliar a situação com um profissional de saúde
Como é que se distingue cansaço e tristeza de depressão?
O cansaço é a resposta do organismo a situações de intensa atividade física ou mental, podendo ser revertido após descanso adequado. A tristeza é uma emoção que surge em situações negativas e é fundamental para o ajustamento às perdas. A depressão, por sua vez, é uma doença caracterizada por uma tristeza patológica, ou seja, que tem uma dimensão e uma extensão que é desproporcional aos acontecimentos de vida. A incapacidade de sentir prazer, a baixa autoestima, o pessimismo e o desinteresse são outros dos sintomas psíquicos da depressão. É também com surgirem sintomas físicos como a astenia que é um cansaço patológico que é desproporcional à atividade física ou mental desenvolvida.
Numa altura em que se fala cada vez mais sobre a importância do equilíbrio entre as vidas profissional e pessoal, que muitas vezes entram em rota de colisão, quais as principais diferenças entre o cansaço dito ‘normal’ e uma situação de ‘burnout’?
O ‘burnout’ é uma síndrome de exaustão relacionada com o trabalho. Ou seja, é uma condição caracterizada pela exaustão emocional, despersonalização, desligamento afetivo do trabalho e baixa ineficácia laboral. Ou seja, para além do cansaço físico e emocional, o ‘burnout’ revela-se pela presença de sintomas especificamente relacionados com o trabalho e com a sua fruição por parte dos trabalhadores.
As férias e a capacidade de ‘desligar’ são fundamentais?
As férias são muito importantes para descansar do ponto de vista físico e mental. É muito importante ‘desligar’ temporariamente do trabalho e usufruir de momentos de descanso e lazer.
De que forma podemos conseguir ter um descanso de qualidade?
Em relação ao descanso, é importante que cada pessoa encontre o seu equilíbrio. Por vezes, apenas é necessário estar sentado confortavelmente. Para outras pessoas, a medicação funciona como uma excelente estratégia de relaxamento e descanso. Já para outros, fechar os olhos é suficiente. Além disso, o sono é outra oportunidade crítica e necessária para o descanso adequado. Para dormirmos bem é importante termos horários estáveis para acordar e deitar, evitar bebidas estimulantes, refeições pesadas e exercício físico intenso antes da hora de dormir, verificar a qualidade do colchão e almofadas e assegurar condições favoráveis de iluminação, ruído e temperaturas.
Que hábitos devemos adotar, no sentido de conseguirmos preservar a nossa saúde mental ao longo de todo o ano?
Os hábitos de vida saudáveis são muito importantes para preservar a saúde mental. Entre eles, incluem-se a alimentação equilibrada, a prática de exercício físico, o sono regular, a evicção do consumo de drogas, incluindo bebidas alcoólicas e tabaco, o estabelecimento de relações sociais equilibradas e o equilíbrio entre os períodos de trabalho e lazer.
O estigma da doença mental tem milénios de evolução e perpassa todas as sociedades do mundo
Por vezes, as pessoas vão acumulando os problemas até chegarem a uma altura em que já não aguentam. O que devem fazer antes de atingir esse pico?
Sempre que sentimos que não conseguimos gerir todas as solicitações devemos procurar implementar as medidas nos nossos hábitos e escolhas que possam aliviar-nos e garantir o descanso necessário. Se sentimos que estamos a sofrer demasiado com as exigências da vida, devemos falar sobre o assunto com um amigo ou familiar e, de seguida, procurar avaliar a situação com um profissional de saúde. Sempre que o sofrimento afeta a nossa vida, altera os nossos comportamentos, diminui as nossas capacidades ou tem uma dimensão que é difícil de controlar, devemos procurar uma avaliação médica. É muito importante falarmos sobre as nossas emoções e partilharmos as nossas angústias com pessoas de confiança.
Muitas vezes, quem sofre de um problema mental autocensura-se. Como se educa as pessoas a procurar ajuda?
O mais importante é que todos saibam que o sofrimento é comum e que existem várias formas de o reduzir.
O tema ‘saúde mental’ continua a ser um estigma social?
O estigma da doença mental tem milénios de evolução e perpassa todas as sociedades do mundo. Nos últimos anos, temos assistido a uma redução do preconceito que está muito relacionado com a maior visibilidade pública dos temas relacionados com a saúde e a doença mental e também com uma maior literacia nestas matérias. É por isso que campanhas como ‘Viva! Para lá da depressão’ são fundamentais. Para ajudar a passar mensagens corretas que se tornam em armas para combater estigmas e preconceitos em matéria de saúde mental.