Advogada afirma que o uso de redes sociais durante o horário de trabalho pode prever em demissão.
Por Aline Macedo, g1
Quem nunca ouviu – ou falou – “não aguento mais o meu trabalho” ou “não aguento mais o meu chefe”?
Frases como essas são comuns no dia a dia de trabalho — mas, quando vão parar nas redes sociais, é desabafo ou ofensa? Será que pode gerar demissão?
Para responder essas e outras dúvidas, o g1 conversou com especialistas em direito do trabalho sobre o uso das redes sociais.
O “desabafo” nas redes sociais podem sim, levar a uma demissão, pois pode ser entendido como má conduta do trabalhador. O desligamento pode ser alegado até como justa causa, afirma a advogada Lariane R. Del-Vechio, especialista em direito do trabalho.
Punições
A demissão não é a única punição aplicada pelas empresas nesse tipo de situação: o trabalhador pode também receber uma suspensão ou uma advertência — como ocorreu com a atendente de loja Camila Figueiredo, de 27 anos.
Em 2019, ela levou uma advertência depois de se manifestar em uma rede social sobre ações ocorridas dentro da loja onde trabalhava.
“Na época, algumas lojas da Paulista tiveram vários casos de racismo. Uma vez um menino negro entrou (na loja onde ela trabalhava) e a mãe dele estava dentro da loja. O segurança abordou a criança como se ele fosse pedinte, e mandou sair da loja só por ele ser negro”, conta. “Teve repercussão no twitter e eu também postei – comentei que esse não era um caso isolado e que a empresa não dava treinamento para os seguranças e que era uma porcaria essas coisas acontecerem”.
No dia seguinte, Camila recebeu uma carta de advertência, que afirmava que ela não podia falar mal da empresa na internet. Para não ser demitida, teve que apagar o post.
O que é considerado uma má conduta das redes sociais?
São considerados como má conduta todos os atos que afetem a imagem da empresa, as regras legais ou algo que ofenda a dignidade de alguém. Atitudes racistas e preconceito também podem ser motivos para o desligamento.
A advogada afirma que o uso das redes sociais durante o horário de trabalho também pode resultar em demissão – como aconteceu com uma estagiária da Prefeitura de São Francisco do Sul (SC), demitida após compartilhar no Tik Tok um vídeo dançando em que vestia o uniforme e crachá.
O funcionário demitido pode entrar na Justiça contra a decisão da empresa?
O funcionário que se sentir prejudicado e não concordar com a decisão pode entrar com uma ação judicial para reverter a justa causa. Para isso, o contratado deve comprovar que sua atitude não interfere a imagem da empresa, não ofende a dignidade de ninguém e regras legais.
Se o funcionário tiver provas de que não ocasionou o dano e a empresa não tiver provas robustas, existe a possibilidade de reverter a justa causa: dependerá do conjunto probatório do empregado e empregador.
Valores legais não precisam estar expressos, assim como o ético, estando previstos inclusive na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) como causas de rescisão indireta em caso de descumprimento. Em casos não estão estabelecidos em lei, no entanto, é interessante ter um manual de condutas e deixar o funcionário ciente disso, para não ser o empregador acusado de rigor excessivo.
Que tipo de provas a empresa pode usar contra o trabalhador?
De acordo com advogado Fabiano Rosa, os principais motivos que geram demissões em relação ao uso das redes sociais estão relacionados à valoração do conteúdo produzido ou, em alguns casos, de violação às regras internas da empresa em relação à vedação ao uso das redes sociais durante à jornada de trabalho.
Entre as principais situações estão:
- Abusos ou exageros de exposições ou opiniões
- Atitudes que revelem a intimidade de integrantes da equipe ou de clientes
- Críticas públicas à empresa, em especial quando utilizadas palavras de baixo calão
- Utilização da marca da empresa de forma indevida
- Má utilização da imagem pessoal do profissional quando vinculada à imagem da empresa
- Quebra de sigilo profissional
Cuidado com os posts de “desabafo” nas redes sociais sobre trabalho:
Infográfico — Foto: g1
Como ficam os procedimentos de desligamento e homologação?
Nos casos de demissão, tanto sem justa causa como com, a empresa deve fazer o pagamento das verbas rescisórias em 10 dias. Na demissão por justa causa, o empregado terá direito apenas ao saldo de salário e às férias vencidas.
Na demissão sem justa causa, o trabalhador deverá receber saldo de salário, férias vencidas e proporcionais, 13º salário, aviso prévio, multa de 40% do FGTS e seguro desemprego.
A homologação da rescisão vai depender do acordado em convenção sindical e no tempo de serviço do funcionário.
Em qual momento as redes sociais são vistas como meio de uso livre de expressão e forma ofensiva?
O marco civil da internet (Lei nº 12.965/2014) foi criado para estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet, entre eles a proteção da privacidade e a proteção dos dados pessoais.
A lei, no entanto, não prevê as repercussões trabalhistas decorrentes dos atos praticado na internet por seus usuários – assim, essa relação deverá ser avaliada e julgada pela Justiça do Trabalho com base na legislação trabalhista.
“Os limites para a livre expressão, seja na internet ou no mundo off-line, estão definidos pelos princípios do Estado Democrático de Direito, sobretudo quando há ataque e afronta à segurança e intimidade de outrem, quando sobrevêm violações às normas de responsabilidade civil, quando cometidos atos manifestamente ilegais e, sobretudo, quando externados atos de violência, preconceitos e discriminações, diz Fabiano Rosa.