Até a semana passada, o céu parecia surpreendentemente azul.
Nem a alta da inflação e nem a subida do dólar vinham sendo suficientes para derrubar o ânimo dos investidores.
Com a publicação dos dados fiscais de setembro, a previsão era de um 2022 muito razoável.
Entre as boas notícias anunciadas pelo Banco Central e o Tesouro Nacional estavam o ótimo resultado obtido desde o início do ano por estados e municípios, que acumularam até setembro o maior superávit primário em trinta anos; a redução do déficit primário do governo federal no período; e, como consequência dos dois fatores, a melhora do resultado do setor público, que saiu do vermelho da pandemia para um superávit de R$ 14 bilhões neste ano.
Os pontos de exclamação nos boletins que circularam entre investidores nos últimos dias ilustravam o otimismo dos analistas.
Mas os mesmos boletins já alertavam para o que poderia estragar o céu de brigadeiro: a incerteza gerada pelas sinalizações do governo Bolsonaro em relação ao orçamento de 2022 e o seu compromisso com o ajuste fiscal.
Até sexta-feira, muitos consideravam que essas sinalizações podiam não significar o pior —a disposição do presidente e sua equipe econômica de promover um aumento permanente e sem lastro da despesa. Talvez fossem apenas fruto de (mais) um problema de comunicação do governo.
Não eram. No sábado, a declaração de Bolsonaro de que tem um temeroso “plano B” para o caso de a PEC dos Precatórios não ser aprovada e a possibilidade de que esse plano passe por heterodoxias como a decretação de estado de calamidade deixaram claro que o governo está disposto a se jogar no poço da irresponsabilidade fiscal se este for o preço da reeleição do ex-capitão.
Diante disso, a alegria do pobre durou pouco.
Ata do Copom publicada nesta manhã diz que “questionamentos relevantes em relação ao futuro do arcabouço fiscal atual” resultaram em “elevação dos prêmios de risco” e “das expectativas de inflação”, o que implica “maior probabilidade para cenários alternativos que considerem taxas neutras de juros mais elevadas”.
Em outras palavras, o que o Banco Central disse foi que o governo está metendo os pés pelas mãos e isso vai levar a um aumento brutal dos juros.
O mercado já aposta numa elevação da Selic para 12% ao ano — lembrando que cada ponto a mais na taxa básica de juros representa um impacto na dívida pública de R$ 35 bilhões a 40 bilhões.
Um experiente analista de mercado diz que os agentes financeiros aceitariam resignados um aumento temporário da despesa. Mas não reagirão da mesma forma diante da percepção de que o furo no teto de gastos —agora cinicamente chamado por aliados do governo de “teto solar”, dado que desliza ao sabor dos elementos— será muito maior que os R$ 30 bilhões sugeridos e tem como propósito viabilizar barganhas políticas com vistas à eleição.
“Com suas ações, o governo está conseguindo jogar na lata de lixo a recuperação fiscal deste ano”, diz o analista.