“Os casais que já tinham problemas continuaram a tê-los ou pioraram a sua situação”, diz a psicóloga Filipa Machado.
O Felizes.pt conversou com quem viu e continua a ver de perto os efeitos da pandemia na saúde mental: o psicólogo clínico e terapeuta familiar e de casal, Tiago Sá Balão, a professora e doutora Filipa Machado Vaz, e a psicóloga Sofia Costa Pais.
Procura por apoio psicológico aumentou, principalmente pelas mulheres
Filipa Machado Vaz liderou o projeto acalma.online, promovido pela Casa do Impacto, criado com o intuito de facultar apoio psicológico gratuito e de forma virtual durante o período de isolamento. A profissional refere que a procura de consultas da especialidade aumentou de forma geral mas, sobretudo, em formato online. Segundo ela foram mais de duas mil sessões realizadas pela ação entre abril e julho.
A psicóloga Sofia Costa Pais confirma este crescimento: “foram as mulheres que mais buscaram apoio psicológico pois o burnout parental ainda é muito sentido por elas, através do acumular de papéis sociais enquanto mães, profissionais, mulheres, e, algumas vezes, mães dos maridos”.
O fato é que segundo a psicóloga, apesar da maioria dos homens tentar cada vez mais ajudar em casa, as expectativas da sociedade para com a mulher mantêm-se elevadas e irrealista, exigindo-lhes mais de si na vida doméstica e com os filhos.
Tiago Sá Balão afirma: “somos seres que procuram estabilidade e, por isso, sempre que existem mudanças, estas geram impacto, quer no indivíduo, quer no casal.” E acrescenta que “ a mudança de rotinas requer uma adaptação de ambas as partes e é essa adaptação que nem sempre é fácil”.
Mas porque é que a pandemia fragilizou os casais?
Com o mundo em suspenso, não nos restou alternativa senão olhar para dentro, enfrentar os nossos próprios problemas e encará-los de frente.
“Os casais que já tinham problemas continuaram a tê-los ou pioraram a sua situação. Se a base já se encontrava fragilizada ou instável por problemas individuais ou no próprio casal, como tendências depressivas, as bases desmoronam. Os casais que já eram flexíveis e tinham melhor entendimento foram menos afetados”, conta Filipa.
Como ultrapassar a imperfeição do outro?
Tolerância é a palavra de ordem. As diferenças dos parceiros têm de ser aceites e sim – toleradas.
Balão aconselha os casais a serem altruístas, resilientes, proativos e perseverantes. Tudo faz parte de um plano de estratégias que os casais foram aconselhados a aplicar, de acordo com um diagnóstico individual e a situação específica de cada casal.
Filipa explica que estas são apelidadas de estratégias de regulação emocional. Estas estratégias devem “valorizar a partilha emocional de cada um; certificar que as necessidades de ambos são tidas em consideração; que os problemas devem ser resolvidos em conjunto e não por imposição de uma das partes. O foco deve estar em cuidar da relação e não do próprio”.
Sofia acredita que este é o momento ideal para os casais se reinventarem e adotarem estratégias para lidar com novas rotinas de isolamento. “Por exemplo, alguns pais estipularam períodos de tempo em que um mantinha-se focado no teletrabalho enquanto o outro prestava auxílio aos filhos e depois trocavam. Dedicaram tempo para estarem um com o outro enquanto casal e tempo para estarem sozinhos”.
O lado positivo do confinamento
Passar tempo juntos como não passavam há muito, este é o principal ponto positivo que os três psicólogos notaram nos indivíduos. Muitos pais ficaram contentes por passar mais tempo com os filhos, assistirem às suas aulas e brincarem mais com eles
Ocorrem ainda melhorias significativas em várias relações em que as pessoas ao passarem mais tempo no mesmo espaço acabaram por se redescobrirem enquanto casal. Reavivaram inclusive paixões antigas como cozinhar, escrever ou fazer trabalhos manuais, e descobriram novos conjuntos de competências.